O Aparelho
Parte 2: Telejornal... o diário dos males do mundo
Durante muito tempo admirei a televisão. Sempre tive um certo fascínio pela comunicação e com a televisão podia ter ali tudo à mão. Nem sequer a mínima sensação de nostalgia me causava por ser uma comunicação unilateral. Aprende-se imenso a ver televisão. Até a ganharmos consciência de que imensa da informação que recebos é filtrada, manipulada, distorcida. Está lá tudo, só precisamos aprender a ver. É necessário ter um olho selectivo. E a primeira selecção que eu fiz foi banir completamente com os noticiários. São, por muito que eu queira, não encontro outra palavra, nojentos.
Todas as criticas que eu já ouvi e li sobre televisão, todas elas são verídicas nos telejornais: a manipulação das notícias, a empolação dos factos, a subliminariedade das ideias subjacentes, a estranha catalogação do que é importante e do que não é, mas sobretudo o que mais me repele é a narratividade trágica das notícias. Hoje em dia o telejornal não passa de um espectáculo encenado para a tragédia. Uma narratividade que começa no ponto mais trágico e dramático para acabar na mais pacífica e feliz comédia. Começa-se nos escândalos, nos mais frenéticos gossips políticos, privilegia-se as notícias que tenham mais mortos, mais sangue, aquelas que mais facilmente apelam ao horror e no final, para acabar em beleza na boa tradição popular, a mais patética e caricaturável curiosidade. A notícia da boa-disposição. Nada me parece mais horrendo.
A televisão que durante tempo foi tão pudica ao ponto de nos avisar das cenas eventualmente chocantes dos filmes, com a já risível bolinha, esquece-se completamente dessa seu tom sempre grave do pudor nos telejornais, em nome da verdade nua e crua, transforma a notícia num qualquer filme na orla da mais brutal e violenta realidade. Nem o fotojornalismo consegue, às vezes, ser tão brutal. Não há ali qualquer base semiológica ou filosófica que sustenha tamanha crueldade, tamanha invasão da privacidade, e a mais repelente de todas as atitudes tele-jornalística a total ausência de piedade, a intromissão na dor daqueles que sofrem as suas perdas, para vermos as vítimas (aqueles que amamos) dos mais bizarros acidentes serem os actores forçados e violados certamente dos seus desejos, transformarem-se nesse filme sedento de drama, tragédia e sangue. O neologismo do nojo mais puro: o telejornal.
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