A beleza das coisas
A beleza das coisas está profundamente gravada no colorido dos teus olhos.
A luz da vida quando nos incide sobre a pele, deita-se connosco, atravessa a razão, e vem pernoitar nos sonhos. Passeio sobre a água alisada pela maré que à minha frente sossobra. Ha uma luz azulada que faz reflexos na crista das ondas e anuncia a chegada da manhã. As gaivotas chegam, fazendo-me companhia, debicam frutos do mar onde uma onda deixou apenas umas gotas de saudade. Outras saudam-me com coreografias graciososas, como se dançassem para mim. Dá que pensar. As ondas marulham de mansinho, o som de um saxofone aparece enchendo de laranja a paisagem. O dia vai ser quente. Há um suspiro no ar que traz de volta o teu perfume. É uma guitarra a dedilhar melodias nos meus sentidos. Uma brincadeira de sonhos que se entrelaçam. Não escrevo palavras na areia mas as palavras ficam retidas nos sonhos e de lá não saiem. Ainda dá mais que pensar. Na estrada de pedra o meu rasto perde-se. O medo assalta-me. Sim, isso de já não me poderes seguir, de não poderes sonhar na mesma dimensão que eu sonho. Estendo-te uma passadeira de rosas brancas que só acaba aonde o mar se vai deitar. É uma estrada de fantasia onde podes perder o resto dos teus dias, como um convite para um passeio sem fim. Uma viagem pelo interior das coisas. É o que dá pensar em ti.
Por isso espreito pelos teus olhos.
segunda-feira, junho 30, 2003
IP5
Estrada de terror. No Jornal da Tarde da RTP1, o jornalista aponta as causas climatéricas, o mau piso e conceção da estrada E a condução dos automobilistas como causas para mais um dia trágico das pistas lusas. Como o jornalismo nacional nos vai habituando a fazer, automáticamente inverti a ordem das causas apontadas. Depois na peça apresentada, o comandante dos Bombeiros Voluntários dizia que a principal razão para tantos acidentes era a falta de civismo...
Estrada de terror. No Jornal da Tarde da RTP1, o jornalista aponta as causas climatéricas, o mau piso e conceção da estrada E a condução dos automobilistas como causas para mais um dia trágico das pistas lusas. Como o jornalismo nacional nos vai habituando a fazer, automáticamente inverti a ordem das causas apontadas. Depois na peça apresentada, o comandante dos Bombeiros Voluntários dizia que a principal razão para tantos acidentes era a falta de civismo...
Popsicle
Luzes revoltas em frenéticos circulos,
Cabeças inquietas de sons metálicos,
E tu lá,
Na confusão vejo o teu olhar triste,
As conversas tontas de dedo em riste,
E tu lá,
Abstraída continuo as conversas de nada,
O pensamento galga a mente povoada,
E tu lá,
Persistem espaços vazios de substância,
Mas incrivelmente estúpidos de constância,
Saíste.
Luzes revoltas em frenéticos circulos,
Cabeças inquietas de sons metálicos,
E tu lá,
Na confusão vejo o teu olhar triste,
As conversas tontas de dedo em riste,
E tu lá,
Abstraída continuo as conversas de nada,
O pensamento galga a mente povoada,
E tu lá,
Persistem espaços vazios de substância,
Mas incrivelmente estúpidos de constância,
Saíste.
domingo, junho 29, 2003
Descriminação positiva?
Se saio com um amigo e vou a uma discoteca tenho direito a um cartão de consumo mínimo de 15 Euros, caso vá com uma amiga, o preço baixa para os 8 Euros. Não que eu não compreenda este critério para manter uma casa equilibradia na relação masculino e feminino, mas não o acho correcto como princípio. Mas o que realmente me indigna é os movimentos feministas não virem reclamar destas descriminações, positivas diria uma amiga minha, descriminação pura e simple digo eu. Eu até sou a favor da igualdade, pena que parte das mulheres ainda não tenha percebido que com a igualdade de direitos também vem a igualdade de deveres, e nunca as vejo reclamar das benesses que esta sociedade ainda lhes vai granjeando.
Se saio com um amigo e vou a uma discoteca tenho direito a um cartão de consumo mínimo de 15 Euros, caso vá com uma amiga, o preço baixa para os 8 Euros. Não que eu não compreenda este critério para manter uma casa equilibradia na relação masculino e feminino, mas não o acho correcto como princípio. Mas o que realmente me indigna é os movimentos feministas não virem reclamar destas descriminações, positivas diria uma amiga minha, descriminação pura e simple digo eu. Eu até sou a favor da igualdade, pena que parte das mulheres ainda não tenha percebido que com a igualdade de direitos também vem a igualdade de deveres, e nunca as vejo reclamar das benesses que esta sociedade ainda lhes vai granjeando.
Ogay?
Conheço alguns homossexuais assumidos que se ninguém me tivesse contado nunca teria notado, mais o mais engraçado, é ouvi-los chamar de "Maricas" todos os homossexuais de trejeitos e poses.... errrrrr.... amaricadas(?). É que se a ideia é serem femininos, deviam olhar melhor para as mulheres porque nem elas se comportam assim. A homossexualidade só tem o seu quê de perversão quando roça o exibicionismo.
Conheço alguns homossexuais assumidos que se ninguém me tivesse contado nunca teria notado, mais o mais engraçado, é ouvi-los chamar de "Maricas" todos os homossexuais de trejeitos e poses.... errrrrr.... amaricadas(?). É que se a ideia é serem femininos, deviam olhar melhor para as mulheres porque nem elas se comportam assim. A homossexualidade só tem o seu quê de perversão quando roça o exibicionismo.
sábado, junho 28, 2003
River-pain
Sempre tive um fascinio por esse músico extraordinário chamado Nick Cave, pela sua poesia marcadamente virada ao lado negro da vida. Aqui fica um poema/música de devota influência.
River-pain River-pain River-pain
Oh! catch the wave you'll blow
a sickness end down the go
You have never felt the skin
so get hold in between
River-pain River-pain River-pain
The legs of sorrow run so fast
I'll pray it to be the last
River-pain River-pain River-pain
Oh! Waterfall in your eye
I've never wished to cry
ghost-tears dropping in
soul gets lost in the spin
River-pain River-pain River-pain
swim over pain
or drown within the chain
River-pain (to fade)
29.novembro.89
Sempre tive um fascinio por esse músico extraordinário chamado Nick Cave, pela sua poesia marcadamente virada ao lado negro da vida. Aqui fica um poema/música de devota influência.
River-pain River-pain River-pain
Oh! catch the wave you'll blow
a sickness end down the go
You have never felt the skin
so get hold in between
River-pain River-pain River-pain
The legs of sorrow run so fast
I'll pray it to be the last
River-pain River-pain River-pain
Oh! Waterfall in your eye
I've never wished to cry
ghost-tears dropping in
soul gets lost in the spin
River-pain River-pain River-pain
swim over pain
or drown within the chain
River-pain (to fade)
29.novembro.89
sexta-feira, junho 27, 2003
As tascas
Disseste que acabavas com tudo e que me deixavas. Fui-me embora sem ouvir mais nada, nem mais uma desculpa ou um porquê teu. Tu ainda chamaste por mim, mas eu segui por uma vida nova, nova e sem ti. Havia de ser assim e assim segui decidido. Parei num bar nesse primeiro dia, ali perto de onde me deixaste. Durante uma semana iam-me lá buscar. Eu embriagado com a cabeça contra a mesa, a tentar adormecer um pesadelo que não me deixava acordar.
Como eras a minha vida parecia que eu não tinha outra.
Tanto me chatearam sobre esta minha nova vida, sobre esta vida que eu vivia sem grande vontade, que me transladei para um café bem perto de minha casa. Durante uma segunda semana mais do que inteira, foi o filho do dono que me levava a casa em ombros. Tinha tratado com ele e assim ficou tratado, eu embebedava-me no bar dele e ele levava-me a casa.
Já ninguém me visitava e até parecia que não tinha casa.
Um dia, sem semana marcada nesta nova vida, uma rapariga embriagada como eu, talvez ferida de um amor desfeito como o que eu tinha, adormeceu sobre o meu ombro e por ele escorregou. Segurei-lhe o queixo, gritei-lhe ao ouvido, esbofeteei-lhe a face. Lá abriu um olho e apelidou-me de goelas. Mas nem vale a pena querer saber porquê.
Foi para tratar dela que a vida me manteve sóbrio, ou para morrer.
Metia-a em casa dela, em casa na sala, da sala para o quarto, no quarto para a cama. Pedia-me sempre para a mudar de sítio, para pô-la noutro lugar. Só queria mesmo era mudar. Quando se está mal, tudo está mal, ou mesmo muito fora de sítio.
Não dormia vestida disse-me, de qualquer maneira eu tinha-a despido.
Os dois na cama de edredão azul marinho, eu por baixo dos lençóis vestido e a tilintar de frio, e ela por cima toda nua a gritar que tinha calor. Era uma situação tão rara e tão pouco sexual ou sensual, que adormecer foi a única coisa que me foi possível fazer. Percorremos a noite toda nesse silêncio do sono e na agitação dos sonhos ébrios e toscos.
Há conversas que não se têm nem na mais doida ressaca.
Quando acordou e se olhou toda nua, nem um ai de admiração pronunciou. Ficou quieta a olhar para mim até eu a questionar. Que foi, nunca viste ninguém a ressacar? Perguntou-me porquê que eu não tomava conta dela, dela e da vida dela para aumentar ainda mais o fardo. Respondi-lhe à pressa e sem pensar que já estava cansado de ser largado, que já tinha tido a minha overdose. Riu-se imenso, meteu-me dentro da cama, contra a sua pele toda fria.
Disse claro que te largo também, mas entretanto, porquê que não podemos ir ficando os dois?
Disseste que acabavas com tudo e que me deixavas. Fui-me embora sem ouvir mais nada, nem mais uma desculpa ou um porquê teu. Tu ainda chamaste por mim, mas eu segui por uma vida nova, nova e sem ti. Havia de ser assim e assim segui decidido. Parei num bar nesse primeiro dia, ali perto de onde me deixaste. Durante uma semana iam-me lá buscar. Eu embriagado com a cabeça contra a mesa, a tentar adormecer um pesadelo que não me deixava acordar.
Como eras a minha vida parecia que eu não tinha outra.
Tanto me chatearam sobre esta minha nova vida, sobre esta vida que eu vivia sem grande vontade, que me transladei para um café bem perto de minha casa. Durante uma segunda semana mais do que inteira, foi o filho do dono que me levava a casa em ombros. Tinha tratado com ele e assim ficou tratado, eu embebedava-me no bar dele e ele levava-me a casa.
Já ninguém me visitava e até parecia que não tinha casa.
Um dia, sem semana marcada nesta nova vida, uma rapariga embriagada como eu, talvez ferida de um amor desfeito como o que eu tinha, adormeceu sobre o meu ombro e por ele escorregou. Segurei-lhe o queixo, gritei-lhe ao ouvido, esbofeteei-lhe a face. Lá abriu um olho e apelidou-me de goelas. Mas nem vale a pena querer saber porquê.
Foi para tratar dela que a vida me manteve sóbrio, ou para morrer.
Metia-a em casa dela, em casa na sala, da sala para o quarto, no quarto para a cama. Pedia-me sempre para a mudar de sítio, para pô-la noutro lugar. Só queria mesmo era mudar. Quando se está mal, tudo está mal, ou mesmo muito fora de sítio.
Não dormia vestida disse-me, de qualquer maneira eu tinha-a despido.
Os dois na cama de edredão azul marinho, eu por baixo dos lençóis vestido e a tilintar de frio, e ela por cima toda nua a gritar que tinha calor. Era uma situação tão rara e tão pouco sexual ou sensual, que adormecer foi a única coisa que me foi possível fazer. Percorremos a noite toda nesse silêncio do sono e na agitação dos sonhos ébrios e toscos.
Há conversas que não se têm nem na mais doida ressaca.
Quando acordou e se olhou toda nua, nem um ai de admiração pronunciou. Ficou quieta a olhar para mim até eu a questionar. Que foi, nunca viste ninguém a ressacar? Perguntou-me porquê que eu não tomava conta dela, dela e da vida dela para aumentar ainda mais o fardo. Respondi-lhe à pressa e sem pensar que já estava cansado de ser largado, que já tinha tido a minha overdose. Riu-se imenso, meteu-me dentro da cama, contra a sua pele toda fria.
Disse claro que te largo também, mas entretanto, porquê que não podemos ir ficando os dois?
A Memória Elogiada
No artigo da Visão o José Mário Silva elogia assim o blog que um dia nos "apadrinhou": «A Memória Inventada tem matéria mais do que suficiente para fazer um livro de contos e crónicas francamente melhor do que a maior parte das coisas que são hoje publicadas em Portugal.». Eu também acho. E o sucesso da Memória nem se pautou por conflitos e polémicas, mas sim palavras que pela sonoridade, o estilo e a forma foram conquistando as pessoas. Daqui o nosso abraço e um silêncio espectante pela próxima história que brote da memória, mesmo que nos enganem por ser, afinal, inventada.
No artigo da Visão o José Mário Silva elogia assim o blog que um dia nos "apadrinhou": «A Memória Inventada tem matéria mais do que suficiente para fazer um livro de contos e crónicas francamente melhor do que a maior parte das coisas que são hoje publicadas em Portugal.». Eu também acho. E o sucesso da Memória nem se pautou por conflitos e polémicas, mas sim palavras que pela sonoridade, o estilo e a forma foram conquistando as pessoas. Daqui o nosso abraço e um silêncio espectante pela próxima história que brote da memória, mesmo que nos enganem por ser, afinal, inventada.
quinta-feira, junho 26, 2003
A lâmina
Na Crónica de Leonete Botelho no Público de ontem transcrevo o paragráfo final com que acaba a sua crónica:
Mas do que mais gosto nos blogues é da sua diversidade. Intrínseca e extrínseca. Faz-me acreditar que o futuro é possível sem que tenhamos todos de nos alistar em qualquer coisa, sem que tenhamos todos de ter rótulos redutores, esquerda-direita, homem-mulher, conservadores-liberais, e tantas coisas que tais. Que todos podemos ser constelações improváveis. E sermos, assim, sempre um pouco mais ricos.
Neste blog temos todos os rótulos redutores referidos no texo: o homem-mulher, a esquerda-direita, o conservadorismo e o liberalismo, a racionalidade e a emotividade, a arte e o engenho. Por isso dizemos que fazemos trapézio numa lâmina de dois gumes, porque apesar de sermos sempre facções opostas, e sabendo que o fio fino da lâmina que divide é intensamente cortante, somos, felizmente, capazes de respeitar as diferenças e, ao invés de querer subjugar o outro à nossa razão, aprender com a pluralidade de opiniões. A lâmina que divide a espada pode rasgar a pele, pode trespassar os tecidos e perfurar o corpo ou pode ser um símbolo. Nós preferimos o símbolo. Os objectos, como as palavras, dependem do uso que lhes dámos.
Na Crónica de Leonete Botelho no Público de ontem transcrevo o paragráfo final com que acaba a sua crónica:
Mas do que mais gosto nos blogues é da sua diversidade. Intrínseca e extrínseca. Faz-me acreditar que o futuro é possível sem que tenhamos todos de nos alistar em qualquer coisa, sem que tenhamos todos de ter rótulos redutores, esquerda-direita, homem-mulher, conservadores-liberais, e tantas coisas que tais. Que todos podemos ser constelações improváveis. E sermos, assim, sempre um pouco mais ricos.
Neste blog temos todos os rótulos redutores referidos no texo: o homem-mulher, a esquerda-direita, o conservadorismo e o liberalismo, a racionalidade e a emotividade, a arte e o engenho. Por isso dizemos que fazemos trapézio numa lâmina de dois gumes, porque apesar de sermos sempre facções opostas, e sabendo que o fio fino da lâmina que divide é intensamente cortante, somos, felizmente, capazes de respeitar as diferenças e, ao invés de querer subjugar o outro à nossa razão, aprender com a pluralidade de opiniões. A lâmina que divide a espada pode rasgar a pele, pode trespassar os tecidos e perfurar o corpo ou pode ser um símbolo. Nós preferimos o símbolo. Os objectos, como as palavras, dependem do uso que lhes dámos.
Desejos
Fui até à janela ver a rua; da paisagem e do que por lá andava, só retive a frase do Lacan: "Não é todos os dias que encontrámos o que foi feito para nos dar a imagem exacta do nosso desejo"
Fui até à janela ver a rua; da paisagem e do que por lá andava, só retive a frase do Lacan: "Não é todos os dias que encontrámos o que foi feito para nos dar a imagem exacta do nosso desejo"
Poemas
Costumo ser extremamente cuidadoso e guardar todas as coisas que escrevo e tenho tudo transcrito para o computador. Mesmo as coisas que acho que não prestam. Já corrigi alguns e já mudei radicalmente outros, afinal todo o mundo é composto de mudança. Hoje descobri um que andava perdido, é sempre um alívio, uma redescoberta (por nunca os ter relido nem me lembrar deles não parecem meus), como vou passá-lo ao computador, aproveito e comparti-lho-o com vocês.
Outrora,
quando os dias respiravam
as serperntes de tão audazes
com os seus imensos venenos
ameaçavam os seres de tão inocentes
Outrora,
quando o amor amava
os seres de tão reais
viviam os dias
cansados de tão arrogante rotina
Outrora,
quando os amantes amavam
as mulheres de tão femininas
faziam os sofrimentos imensos
dos errantes de tão esquecidos
(abril.1990)
Costumo ser extremamente cuidadoso e guardar todas as coisas que escrevo e tenho tudo transcrito para o computador. Mesmo as coisas que acho que não prestam. Já corrigi alguns e já mudei radicalmente outros, afinal todo o mundo é composto de mudança. Hoje descobri um que andava perdido, é sempre um alívio, uma redescoberta (por nunca os ter relido nem me lembrar deles não parecem meus), como vou passá-lo ao computador, aproveito e comparti-lho-o com vocês.
Outrora,
quando os dias respiravam
as serperntes de tão audazes
com os seus imensos venenos
ameaçavam os seres de tão inocentes
Outrora,
quando o amor amava
os seres de tão reais
viviam os dias
cansados de tão arrogante rotina
Outrora,
quando os amantes amavam
as mulheres de tão femininas
faziam os sofrimentos imensos
dos errantes de tão esquecidos
(abril.1990)
Telecomunicações e Relações Humanas
Os Desblogueadores de Conversa perguntam se "as Relações humanas têm beneficiado mais com a tecnologia do que sofrido com esta", dando-nos o seu enfoque no que respeita às telecomunicações. E, confirme-me a Charlotte, tele em grego signifca distância. Ou seja, se esses adventos tecnológicos servem para unir aqueles que a distância separou, a inversa também se aplica. A questão pode ser complexa se analisar-mos o que ela já implicou nas nossas vidas, as dependências que se geram, mas só porque, ao contrário do que Decartes dizia, o bom senso não é a coisa mais bem distriuída deste mundo. Em quase todas as conquistas tecnológicas, o pressuposto é resolver uma nossa (da raça humana) inapditão qualquer ou a resolução de uma qualquer necessidade. De um modo corrente a tecnologia existe para nos facilitar a vida. E, esse facilitar da vida, esse laxismo, transforma muitas das vezes aqueles que estão mais longe (no espaço físico) mais próximos na comodidade do contacto. Será mais fácil, mais variado (outra consequência dos tempos tecnológicos, a necessidade de variar estimulos) falar com pessoas no IRC, no MSN, no ICQ do que telefonar aos amigos, marcar um encontro e termos que desistir do nosso conforto para ir tomar um simples café. A tecnologia ajuda-nos a sermos egoístas, a colmatar as nossas necessidades de forma mais fácil, a estarmos ligados aqueles que amamos quando dantes não o podiamos estar. Mas voltando ao bom senso, não podemos deixar de ter em mente que a tecnologia é só uma extensão do nosso corpo. Há uma vida lá fora....
Os Desblogueadores de Conversa perguntam se "as Relações humanas têm beneficiado mais com a tecnologia do que sofrido com esta", dando-nos o seu enfoque no que respeita às telecomunicações. E, confirme-me a Charlotte, tele em grego signifca distância. Ou seja, se esses adventos tecnológicos servem para unir aqueles que a distância separou, a inversa também se aplica. A questão pode ser complexa se analisar-mos o que ela já implicou nas nossas vidas, as dependências que se geram, mas só porque, ao contrário do que Decartes dizia, o bom senso não é a coisa mais bem distriuída deste mundo. Em quase todas as conquistas tecnológicas, o pressuposto é resolver uma nossa (da raça humana) inapditão qualquer ou a resolução de uma qualquer necessidade. De um modo corrente a tecnologia existe para nos facilitar a vida. E, esse facilitar da vida, esse laxismo, transforma muitas das vezes aqueles que estão mais longe (no espaço físico) mais próximos na comodidade do contacto. Será mais fácil, mais variado (outra consequência dos tempos tecnológicos, a necessidade de variar estimulos) falar com pessoas no IRC, no MSN, no ICQ do que telefonar aos amigos, marcar um encontro e termos que desistir do nosso conforto para ir tomar um simples café. A tecnologia ajuda-nos a sermos egoístas, a colmatar as nossas necessidades de forma mais fácil, a estarmos ligados aqueles que amamos quando dantes não o podiamos estar. Mas voltando ao bom senso, não podemos deixar de ter em mente que a tecnologia é só uma extensão do nosso corpo. Há uma vida lá fora....
Dia Mundial Contra a Droga
O que vale é que todos os dias são dias de algo.
Valorizo muito a boa vontade, mas convenhamos, ninguém anda a obrigar outrem a enveredar por caminhos que não queiram seguir. Poupem-me os lirismos.
Odeio a desresponsabilização a que estamos votados hoje em dia. A culpa é sempre do meio, da sociedade, do infortúnio da vida, enfim, um sem fim de panóplias! A nós é que não pode ser apontada a responsabilidade. Toda a gente sofre, e muito, mas a leviendade de desculpabilizar por vectores externos soa-me a absurdo e de difícil comprovação.
Mais tarde voltaremos a este e outros assuntos polémicos.
O que vale é que todos os dias são dias de algo.
Valorizo muito a boa vontade, mas convenhamos, ninguém anda a obrigar outrem a enveredar por caminhos que não queiram seguir. Poupem-me os lirismos.
Odeio a desresponsabilização a que estamos votados hoje em dia. A culpa é sempre do meio, da sociedade, do infortúnio da vida, enfim, um sem fim de panóplias! A nós é que não pode ser apontada a responsabilidade. Toda a gente sofre, e muito, mas a leviendade de desculpabilizar por vectores externos soa-me a absurdo e de difícil comprovação.
Mais tarde voltaremos a este e outros assuntos polémicos.
Grafitti (II)
Apesar de na minha irreverente adolescência ter colaborado na feitura de alguns grafitti's confesso que agora abomino a ideia. Aprende-se, dizem uns, perde-se a irreverência, dirão outros. Não vou questionar o valor estético dos grafitis, não pela razão de que os gostos não se discutem, mas questiono apenas a sua legitimidade. O grafitti é considerado uma sub-arte, vindo de uma sub-cultura, nascida normalmente em meios culturais mais desfavorecidos. Dizem. Não sei quem os faz. O seu acto é considerado crime de vandalismo. Mas nunca se viu ninguém ser punido ou autuado pelo mesmo. Aliás, os grafitters orgulham-se de actuar na clandestinidade e têm horror as paredes brancas. Todas as pessoas sabem. Eu gosto de respeitar as artes e a maneira artistica de cada um se expressar. Já não respeito é o facto de se fazer arte por cima de outra manifestação artistica. Ou a arquitectura também não é arte?
Apesar de na minha irreverente adolescência ter colaborado na feitura de alguns grafitti's confesso que agora abomino a ideia. Aprende-se, dizem uns, perde-se a irreverência, dirão outros. Não vou questionar o valor estético dos grafitis, não pela razão de que os gostos não se discutem, mas questiono apenas a sua legitimidade. O grafitti é considerado uma sub-arte, vindo de uma sub-cultura, nascida normalmente em meios culturais mais desfavorecidos. Dizem. Não sei quem os faz. O seu acto é considerado crime de vandalismo. Mas nunca se viu ninguém ser punido ou autuado pelo mesmo. Aliás, os grafitters orgulham-se de actuar na clandestinidade e têm horror as paredes brancas. Todas as pessoas sabem. Eu gosto de respeitar as artes e a maneira artistica de cada um se expressar. Já não respeito é o facto de se fazer arte por cima de outra manifestação artistica. Ou a arquitectura também não é arte?
Grafitti (I)
Durante largos anos, e por debaixo da ponte da Arrábida no Porto na marginal de Gaia, ostentava o paredão que segura o Rio Douro ao longo do seu percurso em direcção ao mar, a frase: "Amo-te mais que o sol". De todos as vezes que por lá passei, e foram muitas, sempre me intrigava quem teria sido o escritor daquelas letras enormes, para quem as teria escrito, quanto tempo terá demorado, que riscos correu. Aquelas palavras durante anos exerceram o seu fascínio nas mais variadas pessoas, eu sei. Mesmo estrangeiros que por cá passaram me perguntavam o significado daquelas letras estampadas ao longo do rio, e ficavam também eles fascinados. Não por ser a frase mais poética do mundo, a mais genial, mas o conjunto do seu significado, a sua visibilidade, davam-lhe um carácter mágico. Eu sei, já muitos me disseram. Um dia pintaram todo o paredão de um branco imaculado, fazendo desaparecer a maior mensagem de amor que um rapaz deixou na cidade do Porto. Eu ainda consigo ler a mensagem quando por lá passo...
Durante largos anos, e por debaixo da ponte da Arrábida no Porto na marginal de Gaia, ostentava o paredão que segura o Rio Douro ao longo do seu percurso em direcção ao mar, a frase: "Amo-te mais que o sol". De todos as vezes que por lá passei, e foram muitas, sempre me intrigava quem teria sido o escritor daquelas letras enormes, para quem as teria escrito, quanto tempo terá demorado, que riscos correu. Aquelas palavras durante anos exerceram o seu fascínio nas mais variadas pessoas, eu sei. Mesmo estrangeiros que por cá passaram me perguntavam o significado daquelas letras estampadas ao longo do rio, e ficavam também eles fascinados. Não por ser a frase mais poética do mundo, a mais genial, mas o conjunto do seu significado, a sua visibilidade, davam-lhe um carácter mágico. Eu sei, já muitos me disseram. Um dia pintaram todo o paredão de um branco imaculado, fazendo desaparecer a maior mensagem de amor que um rapaz deixou na cidade do Porto. Eu ainda consigo ler a mensagem quando por lá passo...
quarta-feira, junho 25, 2003
Mar de lamentações
Enquanto alguns discorrem diabólicamente sobre a aridez sentimental, devo confessar que o contrário pode ser bem pior...
Enquanto alguns discorrem diabólicamente sobre a aridez sentimental, devo confessar que o contrário pode ser bem pior...
Atrás da porta
Desengane-se quem achar que tem um conhecimento profundo ou mais íntimo dos dois mentores deste blog. Falamos muito de acontecimentos quotidianos, como poderiamos falar do tempo. São trivialidades. O nosso verdadeiro íntimo será melhor prescrutado nas entrelinhas de um poema, nos segundos sentidos de algumas frases. Muito do escrevemos é ficção, porque a imaginação é grande e nós gostamos. O tom intimista que temos é derivado à cumplicidade que nos assiste. Sabemos que temos a retaguarda protegida e lançamo-nos. E assim vamos continuar.
Desengane-se quem achar que tem um conhecimento profundo ou mais íntimo dos dois mentores deste blog. Falamos muito de acontecimentos quotidianos, como poderiamos falar do tempo. São trivialidades. O nosso verdadeiro íntimo será melhor prescrutado nas entrelinhas de um poema, nos segundos sentidos de algumas frases. Muito do escrevemos é ficção, porque a imaginação é grande e nós gostamos. O tom intimista que temos é derivado à cumplicidade que nos assiste. Sabemos que temos a retaguarda protegida e lançamo-nos. E assim vamos continuar.
Opinas?
Com que então as férias deixam as pessoas opinativas? Que esse dom se mantenha por mais tempo e que dure até ao referendo sobre a Constituição Europeia. E que votem. E não deixem a democracia coxa, sem a expressão do voto como aconteceu com os referendos sobre as Regiões e o Aborto. Opinar é simples, decidir parece uma responsabilidade demasiado grande. O melhor parece ser deixar nas mãos dos outros e depois, comentar, criticar, maldizer....
Com que então as férias deixam as pessoas opinativas? Que esse dom se mantenha por mais tempo e que dure até ao referendo sobre a Constituição Europeia. E que votem. E não deixem a democracia coxa, sem a expressão do voto como aconteceu com os referendos sobre as Regiões e o Aborto. Opinar é simples, decidir parece uma responsabilidade demasiado grande. O melhor parece ser deixar nas mãos dos outros e depois, comentar, criticar, maldizer....
Extremos
Já dizia o meu pai - "És sempre do contra", por isso escrevo com a mão esquerda, tenho ideias mais conservadoras (a minha geração é maioritáriamente de esquerda) e estou sempre constipada no verão. No inverno não há gripe que me pegue, mas passado o solestício de verão e zás! levo logo com um ataque vírico de fazer desaparecer os stocks de Kleenex no Pingo Doce da zona. Bolas!
Já dizia o meu pai - "És sempre do contra", por isso escrevo com a mão esquerda, tenho ideias mais conservadoras (a minha geração é maioritáriamente de esquerda) e estou sempre constipada no verão. No inverno não há gripe que me pegue, mas passado o solestício de verão e zás! levo logo com um ataque vírico de fazer desaparecer os stocks de Kleenex no Pingo Doce da zona. Bolas!
terça-feira, junho 24, 2003
Sonhava em sonhar todos os dias com isso
olhar para trás e o que está para trás ver
por as mãos no sentir e sentir mesmo as tuas mãos
caminhar para trás e para trás andar o tempo
depressa, com a pressa do que ainda não passou
com a ansiedade do que está para vir
olhar para trás do meu olhar antigo
do meu olhar que já passou pelo teu olhar
e fugir dele e do que veio atrás dele
andar para trás, para trás do tempo e do início
do início de um tempo que não devia ter conhecido
do tempo em que te conheci e que ignorava que tu
ignoravas que eu pudesse sofrer, sofrer mesmo
mesmo que as feridas fossem em ti.
26.junho.95
olhar para trás e o que está para trás ver
por as mãos no sentir e sentir mesmo as tuas mãos
caminhar para trás e para trás andar o tempo
depressa, com a pressa do que ainda não passou
com a ansiedade do que está para vir
olhar para trás do meu olhar antigo
do meu olhar que já passou pelo teu olhar
e fugir dele e do que veio atrás dele
andar para trás, para trás do tempo e do início
do início de um tempo que não devia ter conhecido
do tempo em que te conheci e que ignorava que tu
ignoravas que eu pudesse sofrer, sofrer mesmo
mesmo que as feridas fossem em ti.
26.junho.95
segunda-feira, junho 23, 2003
Quadra de S. João (agora na versão PIPI)
Que se foda a sardinha
pró caralho com a tradição
o que eu quero é uma criquinha
para martelar no S. João
Que se foda a sardinha
pró caralho com a tradição
o que eu quero é uma criquinha
para martelar no S. João
Blog or Blogue?
Anda a blogosfera a questionar-se sobre a grafia a dar à abreviatura de Weblogs, se há-de ser no original do Inglês blog, se há-de ser na adaptação a língua de Camões e escrever-se Blogue. Eu prefiro o original Inglês, porque apesar de gostar de ler e ouvir um Português bem falado, não me perturba a inclusão de termos estrangeiros na nossa língua. Mas para quem prefere a grafia aportuguesada, eu tenho uma pergunta: Não seria mais correcto escrever-se Blógue? Se a adaptação ao Português pressupõe uma transcrição fonética do termo....
Já agora, alguém consegue, à primeira, descorrer o significado de lóbi?
Anda a blogosfera a questionar-se sobre a grafia a dar à abreviatura de Weblogs, se há-de ser no original do Inglês blog, se há-de ser na adaptação a língua de Camões e escrever-se Blogue. Eu prefiro o original Inglês, porque apesar de gostar de ler e ouvir um Português bem falado, não me perturba a inclusão de termos estrangeiros na nossa língua. Mas para quem prefere a grafia aportuguesada, eu tenho uma pergunta: Não seria mais correcto escrever-se Blógue? Se a adaptação ao Português pressupõe uma transcrição fonética do termo....
Já agora, alguém consegue, à primeira, descorrer o significado de lóbi?
A Look into the Past
No Sábado à noite a ouvir Smiths numa incursão ao passado, deliciamo-nos com as algumas das frases da música "How soon is now".
I am the son
And the heir
Of a shyness that is criminally vulgar
I am the son and heir
Of nothing in particular
You shut your mouth
How can you say
I go about things the wrong way ?
I am Human and I need to be loved
Just like everybody else does
There's a club, if you'd like to go
You could meet somebody who really loves you
So you go, and you stand on your own
And you leave on your own
And you go home, and you cry
And you want to die
When you say it's gonna happen "now"
Well, when exactly do you mean ?
See I've already waited too long
And all my hope is gone
Ele há coisas que se mantêm inalteráveis desde a juventude
No Sábado à noite a ouvir Smiths numa incursão ao passado, deliciamo-nos com as algumas das frases da música "How soon is now".
I am the son
And the heir
Of a shyness that is criminally vulgar
I am the son and heir
Of nothing in particular
You shut your mouth
How can you say
I go about things the wrong way ?
I am Human and I need to be loved
Just like everybody else does
There's a club, if you'd like to go
You could meet somebody who really loves you
So you go, and you stand on your own
And you leave on your own
And you go home, and you cry
And you want to die
When you say it's gonna happen "now"
Well, when exactly do you mean ?
See I've already waited too long
And all my hope is gone
Ele há coisas que se mantêm inalteráveis desde a juventude
sábado, junho 21, 2003
Parabéns Portugal
Portugal venceu o Torneio de Toulon o prestigiado torneio internacional para jogadores sub-20. Portugal foi arrasador, com uma mentalidade que finalmente parece estar a mudar em Portugal. A de que podemos ser vencedores. Vitórias sobre a Ingalterra (3-0), Argentina (3-0), Turquia (2-0) e Itália (3-1), tendo tido a derrota da praxe para abrilhantar o nervosismo com o Japão (0-1). Ou seja 2 golos sofridos e 11 golos marcados, 10 deles por jogadores do Sporting. O Benfica não tinha nenhum jogador seleccionado.
Portugal venceu o Torneio de Toulon o prestigiado torneio internacional para jogadores sub-20. Portugal foi arrasador, com uma mentalidade que finalmente parece estar a mudar em Portugal. A de que podemos ser vencedores. Vitórias sobre a Ingalterra (3-0), Argentina (3-0), Turquia (2-0) e Itália (3-1), tendo tido a derrota da praxe para abrilhantar o nervosismo com o Japão (0-1). Ou seja 2 golos sofridos e 11 golos marcados, 10 deles por jogadores do Sporting. O Benfica não tinha nenhum jogador seleccionado.
Flash mobs
Multidões inexplicáveis
CHAMAM-LHES "flash mobs" ou "inexplicable mobs" e são a última moda em Nova Iorque. Milhares de pessoas são convocadas por "e-mail" (ou SMS) para aparecerem num determinado sítio a uma determinada hora só com o objectivo de formar uma multidão inexplicável. Ora vejam lá esta numa venda de tapetes...
Não quero estar a dar ideias, mas se a moda pega pode ser uma boa estratégia para terroristas. Nunca gostei de multidões, muito menos inexplicáveis. A necessidade de pertença às vezes vai longe demais...
Multidões inexplicáveis
CHAMAM-LHES "flash mobs" ou "inexplicable mobs" e são a última moda em Nova Iorque. Milhares de pessoas são convocadas por "e-mail" (ou SMS) para aparecerem num determinado sítio a uma determinada hora só com o objectivo de formar uma multidão inexplicável. Ora vejam lá esta numa venda de tapetes...
Não quero estar a dar ideias, mas se a moda pega pode ser uma boa estratégia para terroristas. Nunca gostei de multidões, muito menos inexplicáveis. A necessidade de pertença às vezes vai longe demais...
A Luz
Por falar em E. Melo e Castro aqui fica um esforço de 1990
Penso no azul da luz dos olhos
canso a luz dos teus olhos
Amanso dos olhos a luz cansada
De olhar a luz amansada dos teus olhos
De olhar bem nos azuis olhos pensados
De vencer no azul cansado da luz
Desvanecer os olhos do cansaço
Enraivecer a luz azul do descanso
Azular a raiva de olhares pensados
Azular enraiva os pensamentos olhados
Que cansa a luz azul tão amansada
Que dança nos olhos a luz corada
Da cor acidulada dos olhos azuis
De acidar o olhar com tanta cor
De acidar o amor de cor azulada
De cuidar do olhar de cansada
Descansado no azul da luz do olhar
Enraivecido o brilho da cor acidulada
Azulada a raiva nos olhos patenteada
De azular nos olhos a raiva amada
Calada a voz da luz bem pensada
Calada a luz da voz sem mais nada
Entalada a voz na cor azulada dos olhos
15outubro90, 18h18mns.
Por falar em E. Melo e Castro aqui fica um esforço de 1990
Penso no azul da luz dos olhos
canso a luz dos teus olhos
Amanso dos olhos a luz cansada
De olhar a luz amansada dos teus olhos
De olhar bem nos azuis olhos pensados
De vencer no azul cansado da luz
Desvanecer os olhos do cansaço
Enraivecer a luz azul do descanso
Azular a raiva de olhares pensados
Azular enraiva os pensamentos olhados
Que cansa a luz azul tão amansada
Que dança nos olhos a luz corada
Da cor acidulada dos olhos azuis
De acidar o olhar com tanta cor
De acidar o amor de cor azulada
De cuidar do olhar de cansada
Descansado no azul da luz do olhar
Enraivecido o brilho da cor acidulada
Azulada a raiva nos olhos patenteada
De azular nos olhos a raiva amada
Calada a voz da luz bem pensada
Calada a luz da voz sem mais nada
Entalada a voz na cor azulada dos olhos
15outubro90, 18h18mns.
A confissão
Lembro-me bem.
Ele está a olhar nos olhos dela. Estão assim há bastante tempo. Não que sintam o tempo passar. Os olhos dele brilham e os dela correspondem. Há desejo naquele olhar. Não sei do que falam mas também eles próprios não saberão. Continuo a lembrar-me. Ele sorri de algo que ela diz e ela acompanha-o. Sinto necessidade de me lembrar deles. Estão quase a dar as mãos enquanto ele brinca com a orla do cinzeiro onde ela vai deitando a cinza do seu cigarro. Ela apaga o cigarro e sem saberem muito bem como aconteceu as mãos daram-se. Foram eles que as deram. Lembro-me bem. A boca dele parece querer falar. Ela espera que a boca dele fale. Os seus olhos nunca perderam o contacto. Ele está mesmo prestes a dizer-lhe. Mas da sua boca só saiem palavras toscas e sem significado. Os olhos dele fogem do olhar dela que revela toda a estranheza que vai no seu interior. Ela retira a a mão dela do entrelaçado da mão dele e acende outro cigarro. Ficam calados até ao fim da noite, no meio do grupo de amigos que entretanto se foi juntando a eles. Nunca saberão mais nada um do outro, eu sei. Ela lembrar-se-a dele uma vez por outra, mas talvez só pela covardia que ele demontrou. Ele talvez ainda hoje se recorde.
Lembro-me bem.
Ele está a olhar nos olhos dela. Estão assim há bastante tempo. Não que sintam o tempo passar. Os olhos dele brilham e os dela correspondem. Há desejo naquele olhar. Não sei do que falam mas também eles próprios não saberão. Continuo a lembrar-me. Ele sorri de algo que ela diz e ela acompanha-o. Sinto necessidade de me lembrar deles. Estão quase a dar as mãos enquanto ele brinca com a orla do cinzeiro onde ela vai deitando a cinza do seu cigarro. Ela apaga o cigarro e sem saberem muito bem como aconteceu as mãos daram-se. Foram eles que as deram. Lembro-me bem. A boca dele parece querer falar. Ela espera que a boca dele fale. Os seus olhos nunca perderam o contacto. Ele está mesmo prestes a dizer-lhe. Mas da sua boca só saiem palavras toscas e sem significado. Os olhos dele fogem do olhar dela que revela toda a estranheza que vai no seu interior. Ela retira a a mão dela do entrelaçado da mão dele e acende outro cigarro. Ficam calados até ao fim da noite, no meio do grupo de amigos que entretanto se foi juntando a eles. Nunca saberão mais nada um do outro, eu sei. Ela lembrar-se-a dele uma vez por outra, mas talvez só pela covardia que ele demontrou. Ele talvez ainda hoje se recorde.
sexta-feira, junho 20, 2003
Água
Elevei-me no ar com um impulso e entrei recta na água, a sensação de frescura ao fazer o mergulho atenuou muito a persistente dor de cabeça. Um novo mergulho e faço uma piscina por baixo de água, quando venho à superficie reparo que já estás à minha frente dentro de água, os teus olhos da cor do fundo onde estamos fazem contraste com o que nos rodeia. Vou novamente estender-me ao sol para recuperar a temperatura. Olhas de soslaio e esboças meio sorriso, ficas atento a todas as brincadeiras que fazem as crianças. Numa perguiça de fim de tarde, dormito espraiada quando reparo que vens na minha direcção, sorris timidamente e quando me olhas nos olhos perdes a coragem e fazes um desvio no percurso. Ficamos assim.
Elevei-me no ar com um impulso e entrei recta na água, a sensação de frescura ao fazer o mergulho atenuou muito a persistente dor de cabeça. Um novo mergulho e faço uma piscina por baixo de água, quando venho à superficie reparo que já estás à minha frente dentro de água, os teus olhos da cor do fundo onde estamos fazem contraste com o que nos rodeia. Vou novamente estender-me ao sol para recuperar a temperatura. Olhas de soslaio e esboças meio sorriso, ficas atento a todas as brincadeiras que fazem as crianças. Numa perguiça de fim de tarde, dormito espraiada quando reparo que vens na minha direcção, sorris timidamente e quando me olhas nos olhos perdes a coragem e fazes um desvio no percurso. Ficamos assim.
A Praia
Permaneço imóvel, debruçado sobre o teu sorriso como se ele fosse uma janela para o mundo. Não percebo como fomos morrer na praia. Escondes-te por detrás de um vidro negro que colocas sobre os olhos. Uma metáfora penso eu, tu não te dás conta. O teu olhar de soslaio atravessa o café e vem em ondas de encontro a mim. O calor abafa-nos os sentidos. Conhecemo-nos no inverno onde o teu olhar ainda verde de menina me gelava a razão, e eu ficava enredado na teia das tuas artimanhas. Eu a fingir de inocente, o mundo a correr como devia, no caminho que nos levava a um precípicio que o meu medo de vertigens soube afastar-me a tempo. Tu a areia e eu a água, ambos a fugir pelos dedos de um destino que nos tentava agarrar numa praia perto de mais.
Permaneço imóvel, debruçado sobre o teu sorriso como se ele fosse uma janela para o mundo. Não percebo como fomos morrer na praia. Escondes-te por detrás de um vidro negro que colocas sobre os olhos. Uma metáfora penso eu, tu não te dás conta. O teu olhar de soslaio atravessa o café e vem em ondas de encontro a mim. O calor abafa-nos os sentidos. Conhecemo-nos no inverno onde o teu olhar ainda verde de menina me gelava a razão, e eu ficava enredado na teia das tuas artimanhas. Eu a fingir de inocente, o mundo a correr como devia, no caminho que nos levava a um precípicio que o meu medo de vertigens soube afastar-me a tempo. Tu a areia e eu a água, ambos a fugir pelos dedos de um destino que nos tentava agarrar numa praia perto de mais.
TOUCHÉ!!
A nossa estudante-empenhada-em-ler-blogs mandou-nos um e-mail a demonstrar a sua indignação por não a termos citado ipsis litteris. É verdade. Às vezes, dou-me a estas liberdades. Sei lá apetece-me. Esvaio-me do espiríto democrático e eleva-se em mim o ditador em potência. Está certo, não resisto em impôr à mensagem o meu cunho pessoal. Ele há coisas...
Talvez, já sabendo desta propensão Narcisista criámos um blog com comentários, onde as pessoas têm o poder de depôr (esta palavra soa-me a efeito mediático) o que lhes vai na alma na forma ipsis litteris sem a nossa intervenção divina. Somos democráticos, mas na nossa casa mandámos nós. Que fazer?
Mas, minha cara estudante-empenhada-também-em-escrever-e-mails, gostámos muito dos seus e-mails, das suas indignações furiosas, em bom estilo gráfico e com vigorosa utilização do CAPS e uma bela escrita; "a semente da discórdia que brota nas entrelinhas dos textos" há-de ficar na minha memória por longos tempos, e ao "há algo de visceral na arte de esgrimir com palavras contudentes(...) geram golpes incicatrizáveis na memória da pele" só lhe digo: TOUCHÉ!!!
***Nota aqui da redacção: A forma elogiosa com que nos refere em algumas partes do seu e-mail impedem-me de o transcrever ipsis litteris. Haja decoro!
A nossa estudante-empenhada-em-ler-blogs mandou-nos um e-mail a demonstrar a sua indignação por não a termos citado ipsis litteris. É verdade. Às vezes, dou-me a estas liberdades. Sei lá apetece-me. Esvaio-me do espiríto democrático e eleva-se em mim o ditador em potência. Está certo, não resisto em impôr à mensagem o meu cunho pessoal. Ele há coisas...
Talvez, já sabendo desta propensão Narcisista criámos um blog com comentários, onde as pessoas têm o poder de depôr (esta palavra soa-me a efeito mediático) o que lhes vai na alma na forma ipsis litteris sem a nossa intervenção divina. Somos democráticos, mas na nossa casa mandámos nós. Que fazer?
Mas, minha cara estudante-empenhada-também-em-escrever-e-mails, gostámos muito dos seus e-mails, das suas indignações furiosas, em bom estilo gráfico e com vigorosa utilização do CAPS e uma bela escrita; "a semente da discórdia que brota nas entrelinhas dos textos" há-de ficar na minha memória por longos tempos, e ao "há algo de visceral na arte de esgrimir com palavras contudentes(...) geram golpes incicatrizáveis na memória da pele" só lhe digo: TOUCHÉ!!!
***Nota aqui da redacção: A forma elogiosa com que nos refere em algumas partes do seu e-mail impedem-me de o transcrever ipsis litteris. Haja decoro!
quinta-feira, junho 19, 2003
A dança de Vera
Foi assim que eu conheci Vera, com a minha mão a fazer cócegas na dela. O sorriso a desprender-se dos cabelos vermelhos de Vera mas as mãos sempre dadas. Não largava os olhos da profundidade ansiosa de ser descoberta pelos meus. Era a minha alma que falava pelo corredor estreito dos nossos dedos entrelaçados. Os olhos amêndoa de Vera que brilhavam na inconstância do momento, o seu corpo delgado e muito bonito que surgia entre os fumos da discoteca, rodopiando em torno da minha mão sem se desprender dela. Vera e eu agarrados, mais do que mãos dadas. Éramos almas siamesas que dormiam juntas, sem se tocarem, mas já de si fundidas. Vera dizia que o amor devia ser assim. Era a minha mão a agarrar a vida de Vera, a fazer dela a minha vida.
Vera dizia-me que aquilo que estava mais perto de se parecer com o seu maior desejo era o amor. Era isso que me atraia a ela. O amor também não me chegava. Mas não havia nehuma outra palavra que pudesse significar o meu maior desejo. Aquilo que era parecido com o meu maior desejo era Vera.
Foi por este tipo de pensamentos que eu e Vera ficamos mais de duas horas encostados ao balcão a falar das palavras que nunca davam jeito porque nunca significavam aquilo que era o nosso mundo. Nosso, mesmo nosso, porque parecia que os outros não existiam. Esse mundo que era só nosso. Nós no balcão do nosso bar, com o nosso empregado que parecia estar ali só para nos servir a nós. Ficou um sentimento de posse tão grande no ar, que a ideia de que eu a queria só para mim me expulsou do bar e dos olhos inundados de magia de Vera.
Vera dançava muito bem o tango. Era verdade. Mesmo que eu nunca tivesse dançado o tango com Vera, ou mesmo que a tivesse visto dançar. Se Vera dizia, era porque era verdade, e as almas que brilham como Vera falam sempre a verdade. Quando dancei com Vera, com as mão presas a servir de âncora a uma relação que galopava ao sabor dos ventos imparáveis dos tornados, percebi que era verdade. Foi assim que eu conheci Vera. Com a minha mão dada a dela, a fazer-lhe cócegas nos olhinhos amêndoa.
Vera sonhava muito. Dizia-me ela. E eu só podia acreditar. Sonhos que se fazem acordado e outros que se têm a dormir. Os sonhos geralmente são quimeras mas Vera tinha-os práticos. A maior parte deles satisfaziam-se rapidamente e sem grande trabalho, às vezes, era só preciso ir a um supermercado. Mas a maneira como Vera falava dos seus sonhos tornava-os mágicos. Era verdade. Havia algo de mágico no querer de Vera.
Vera dançava imparável no meio da pista como o vento sem obstáculos numa planície quente. Eu encostei-me ao balcão sem o peso âncora da mão de Vera. Parecia flutuar numa das muitas nuvens de fumo à minha volta. Estava a um passo de mergulhar na loucura arrepiante do mundo Vera. Era paixão, sussurrava um dos muitos anjos que me circundavam. Ou voltava para a mão de riso de Vera ou fugia. Fugir de medo. Fugir por ter medo de deixar de ter controlo. Fugir por ser incapaz de resistir.
Foi assim a ultima vez que vi Vera. A dançar com o seu corpo delgado e bonito, fazendo reluzir o cabelo vermelho por entre os fumos da discoteca. A mão sozinha esperando pela minha, mas ainda cheia de ternura. Os olhinhos ainda a rirem. Assim era Vera.
Foi assim que eu conheci Vera, com a minha mão a fazer cócegas na dela. O sorriso a desprender-se dos cabelos vermelhos de Vera mas as mãos sempre dadas. Não largava os olhos da profundidade ansiosa de ser descoberta pelos meus. Era a minha alma que falava pelo corredor estreito dos nossos dedos entrelaçados. Os olhos amêndoa de Vera que brilhavam na inconstância do momento, o seu corpo delgado e muito bonito que surgia entre os fumos da discoteca, rodopiando em torno da minha mão sem se desprender dela. Vera e eu agarrados, mais do que mãos dadas. Éramos almas siamesas que dormiam juntas, sem se tocarem, mas já de si fundidas. Vera dizia que o amor devia ser assim. Era a minha mão a agarrar a vida de Vera, a fazer dela a minha vida.
Vera dizia-me que aquilo que estava mais perto de se parecer com o seu maior desejo era o amor. Era isso que me atraia a ela. O amor também não me chegava. Mas não havia nehuma outra palavra que pudesse significar o meu maior desejo. Aquilo que era parecido com o meu maior desejo era Vera.
Foi por este tipo de pensamentos que eu e Vera ficamos mais de duas horas encostados ao balcão a falar das palavras que nunca davam jeito porque nunca significavam aquilo que era o nosso mundo. Nosso, mesmo nosso, porque parecia que os outros não existiam. Esse mundo que era só nosso. Nós no balcão do nosso bar, com o nosso empregado que parecia estar ali só para nos servir a nós. Ficou um sentimento de posse tão grande no ar, que a ideia de que eu a queria só para mim me expulsou do bar e dos olhos inundados de magia de Vera.
Vera dançava muito bem o tango. Era verdade. Mesmo que eu nunca tivesse dançado o tango com Vera, ou mesmo que a tivesse visto dançar. Se Vera dizia, era porque era verdade, e as almas que brilham como Vera falam sempre a verdade. Quando dancei com Vera, com as mão presas a servir de âncora a uma relação que galopava ao sabor dos ventos imparáveis dos tornados, percebi que era verdade. Foi assim que eu conheci Vera. Com a minha mão dada a dela, a fazer-lhe cócegas nos olhinhos amêndoa.
Vera sonhava muito. Dizia-me ela. E eu só podia acreditar. Sonhos que se fazem acordado e outros que se têm a dormir. Os sonhos geralmente são quimeras mas Vera tinha-os práticos. A maior parte deles satisfaziam-se rapidamente e sem grande trabalho, às vezes, era só preciso ir a um supermercado. Mas a maneira como Vera falava dos seus sonhos tornava-os mágicos. Era verdade. Havia algo de mágico no querer de Vera.
Vera dançava imparável no meio da pista como o vento sem obstáculos numa planície quente. Eu encostei-me ao balcão sem o peso âncora da mão de Vera. Parecia flutuar numa das muitas nuvens de fumo à minha volta. Estava a um passo de mergulhar na loucura arrepiante do mundo Vera. Era paixão, sussurrava um dos muitos anjos que me circundavam. Ou voltava para a mão de riso de Vera ou fugia. Fugir de medo. Fugir por ter medo de deixar de ter controlo. Fugir por ser incapaz de resistir.
Foi assim a ultima vez que vi Vera. A dançar com o seu corpo delgado e bonito, fazendo reluzir o cabelo vermelho por entre os fumos da discoteca. A mão sozinha esperando pela minha, mas ainda cheia de ternura. Os olhinhos ainda a rirem. Assim era Vera.
terça-feira, junho 17, 2003
Ui,ui.
Já passou uma semana, e ainda hoje não consigo aceder aos blogs sem passar pela Coluna Infame... Como qualquer criatura de hábitos.
Ainda tenho esperança de um dia lá chegar e não ver o derradeiro post em bold. Eu sei que é estúpido, mas desde quando a razão rege a emoção?
Já passou uma semana, e ainda hoje não consigo aceder aos blogs sem passar pela Coluna Infame... Como qualquer criatura de hábitos.
Ainda tenho esperança de um dia lá chegar e não ver o derradeiro post em bold. Eu sei que é estúpido, mas desde quando a razão rege a emoção?
segunda-feira, junho 16, 2003
Plácidos dias
O andamento do tempo fazia lembrar a infância, tudo parecia planar numa existência sem sobressaltos. Seguia a vida como quem tem um encontro marcado, não se podia atrasar nem queria chegar cedo demais. A rotina do trabalho fazia que tivesse uma percepção especial do entorno, toda a vida estava compartimentada em secções diversas. Muitas vezes achava fria esta forma tão peculiar de agir, mas a comodidade da formula valia o esforço de não pensar o quanto desligada da essência se encontrava.
Ser estranho este que caminhava todos os dias ao seu lado, quase como uma sombra, e como tal sem uma caracteristica marcante. Foram passando os anos e a cumplicidade do ritual ligou-os de forma irreparável. Os laços forjados no desconhecido têm uma validade eterna e inquebrável. E ia decorrendo o tempo assim até ao dia que por motivos estranhos um dos personagens não fez o percurso. Foi o cair de um mundo, a confusão instalou-se na sua vida. Já não contava com a benece do apoio dado pelo companheiro de viagem. Nunca mais teve forças para sair e fazer o mesmo percurso, teve de mudar de trabalho e de casa. Nunca tinha sequer dirigido um bom dia ao companheiro de viagem.
Temos em nós o mundo que fazemos.
O andamento do tempo fazia lembrar a infância, tudo parecia planar numa existência sem sobressaltos. Seguia a vida como quem tem um encontro marcado, não se podia atrasar nem queria chegar cedo demais. A rotina do trabalho fazia que tivesse uma percepção especial do entorno, toda a vida estava compartimentada em secções diversas. Muitas vezes achava fria esta forma tão peculiar de agir, mas a comodidade da formula valia o esforço de não pensar o quanto desligada da essência se encontrava.
Ser estranho este que caminhava todos os dias ao seu lado, quase como uma sombra, e como tal sem uma caracteristica marcante. Foram passando os anos e a cumplicidade do ritual ligou-os de forma irreparável. Os laços forjados no desconhecido têm uma validade eterna e inquebrável. E ia decorrendo o tempo assim até ao dia que por motivos estranhos um dos personagens não fez o percurso. Foi o cair de um mundo, a confusão instalou-se na sua vida. Já não contava com a benece do apoio dado pelo companheiro de viagem. Nunca mais teve forças para sair e fazer o mesmo percurso, teve de mudar de trabalho e de casa. Nunca tinha sequer dirigido um bom dia ao companheiro de viagem.
Temos em nós o mundo que fazemos.
domingo, junho 15, 2003
Toda a gente encanta também canta
Durante os anos 90 assitimos a moda de tudo o que era modelo enverdar por uma carreira cinematográfica. Normalmente com um sucesso pouco reduzido, o nome das Supertop models não era suficiente para arrastar multidões e o fenómeno foi-se esbatendo. Do desastre das participações da Cindy Crawford, Claudia Schiffer, Elle Mcpherson, Angie Everhardt, Carre Otis e por ai fora, salvaram-se com mérito e distinção a Charlize Theron, a Milla Jovovich e mesmo a Cameron Diaz. No final dos anos 90 a Jennifer Lopez deu o mote para a grande moda do início do novo século a das actrizes que viram o seu mercado invadido pelas modelos a interferirem no campo musical. O sucesso de J-Lo, acompanhado do mega sucesso de Nicole Kidman e Robbie Williams abriu as portas a que de repente sejamos invadidos por albums cantados por actrizes, senão vejamos: Julie Delpy, Juliette Lewis, Jennifer Love Hewit, Isabelle Adjani e claro aquelas que já passaram por estas mudanças todas. Sim, que já foram modelos, actrizes e que também cantam: Milla Jovovich e Carla Bruni. Ah! E não nos esqueçamos das precurssoras Kylie Minogue e Natalie Imbruglia. E consta que há mais na calha...
Não foi um post lá muito brilhante mas também com tanta mulher bonita a atrapalhar-me a escrita que esperavam?!!
Durante os anos 90 assitimos a moda de tudo o que era modelo enverdar por uma carreira cinematográfica. Normalmente com um sucesso pouco reduzido, o nome das Supertop models não era suficiente para arrastar multidões e o fenómeno foi-se esbatendo. Do desastre das participações da Cindy Crawford, Claudia Schiffer, Elle Mcpherson, Angie Everhardt, Carre Otis e por ai fora, salvaram-se com mérito e distinção a Charlize Theron, a Milla Jovovich e mesmo a Cameron Diaz. No final dos anos 90 a Jennifer Lopez deu o mote para a grande moda do início do novo século a das actrizes que viram o seu mercado invadido pelas modelos a interferirem no campo musical. O sucesso de J-Lo, acompanhado do mega sucesso de Nicole Kidman e Robbie Williams abriu as portas a que de repente sejamos invadidos por albums cantados por actrizes, senão vejamos: Julie Delpy, Juliette Lewis, Jennifer Love Hewit, Isabelle Adjani e claro aquelas que já passaram por estas mudanças todas. Sim, que já foram modelos, actrizes e que também cantam: Milla Jovovich e Carla Bruni. Ah! E não nos esqueçamos das precurssoras Kylie Minogue e Natalie Imbruglia. E consta que há mais na calha...
Não foi um post lá muito brilhante mas também com tanta mulher bonita a atrapalhar-me a escrita que esperavam?!!
Dizeres
Sempre me fascinaram as t-shirts com dizeres que algumas raparigas usam. Entre o bom gosto e acutilância até ao despropositado e banal muita coisa foi dada a ler. A de hoje ultrapassa os meus limites de compreensão na procura de razões e significados do seu uso. Senão vejamos, e a começar no colo e em sentido descendente:
Young
Younger
Unused
Sinais dos tempos? Provocação? Fiquei sem saber e sem vontade de ir perguntar.
Sempre me fascinaram as t-shirts com dizeres que algumas raparigas usam. Entre o bom gosto e acutilância até ao despropositado e banal muita coisa foi dada a ler. A de hoje ultrapassa os meus limites de compreensão na procura de razões e significados do seu uso. Senão vejamos, e a começar no colo e em sentido descendente:
Young
Younger
Unused
Sinais dos tempos? Provocação? Fiquei sem saber e sem vontade de ir perguntar.
sábado, junho 14, 2003
Karma Chameleon
Às vezes apetecia-me que a música dos Culture Club fosse mais próxima da realidade. O destino haveria de ser mais plural e democrático.
Às vezes apetecia-me que a música dos Culture Club fosse mais próxima da realidade. O destino haveria de ser mais plural e democrático.
Where is your mind at
No Ponto e Virgula descreve-se a seguinte situação:
Hoje, ao arrumar uma frigideira no armário a que pertence, li uma minúscula gravação no metal, que me deixou deveras perturbado - "aço inexorável". Bom, é mais que óbvio que onde se lê "inexorável" se lia o outro, o que acompanha na maioria das vezes a palavra "aço". Será que estou a ficar tão apanhadinho que vejo o dicionário em tudo?
Pois eu hoje ao ler uma publicidade troquei cabelo por cabala, será que isso faz de mim um socialista?
No Ponto e Virgula descreve-se a seguinte situação:
Hoje, ao arrumar uma frigideira no armário a que pertence, li uma minúscula gravação no metal, que me deixou deveras perturbado - "aço inexorável". Bom, é mais que óbvio que onde se lê "inexorável" se lia o outro, o que acompanha na maioria das vezes a palavra "aço". Será que estou a ficar tão apanhadinho que vejo o dicionário em tudo?
Pois eu hoje ao ler uma publicidade troquei cabelo por cabala, será que isso faz de mim um socialista?
Shakespeare Martini
The sun bends lazy over the blue ocean
The sea tickles the wood feet of the empty esplanade
I didn’t mean to hurt you with the murmur of my heart
When I said love was at the gate of my veins
Lovely words do no broke strengthened hearts
The heat plays distortions on my mind through the fringe of times
Flaming with the hallucination of the wind ideas flow rapidly
Do I need to hear this voice that wails upon me?
The swordfish points its syringe to a duel
Past and future clash inside remembrances and forgetfulness
Embrace me deeply my lost love, my wounded heart sinks under my feet
In the sewer where romance don’t prevail
Martini sings its melody in a colored orange sunset
Sometimes it snows in April says the lyrics
But it’s June and sunny weather never drowns
On my boozy dizzy head, my boiled water of sorrows
Do I need to ear the non-sense of a green algae upon me?
It beats; of course it beats, sprinkles the heart that pumps my veins
Its not whisky its not vodka it’s a liquor jealousy that travels in me
Bottled cruelly with the poison of your staring blue in which you endeavor so often
The arts and crafts where your disrespect blossoms
You mislead me in the use of the outrageous power of my hurtful speech
Tickling the bells of a future untold and persecuted for the sparkle of happiness
Do I need to bend like a thin oak tree to your windy desires?
I am the bunch of grapes that you step to fulfill your thirst
The distilled alcohol of a wedding party that not even the engaged couples appear
The wrist broken in a lovers fight for the need of grabbing you
Like the hug of non-slept nights we had
I am the vivid and clear overcome of the emptiness of selves
I am the leak in the ceiling of your consistency
And latent, a huge river will rise in this chain of drops
Do I hear the drip that your eyes spill in the naked concrete?
Do I?
Do I have the strength dispersed through the pasted years of togetherness?
Should I embrace the future, leaving sorrows in the shoulder pad of the door?
Should I?
Are you not tired of the mockery of your stupid games of love?
The betrayal, the stories unspoken, and the rarely lovely words said
Are you counting all of the drops that you drop in the theatre of lust?
It’s the same theatre that you mount with tons of spectacle to deceive me.
And do I worth it?
Do I?
And this is not hunger that it is speaking - as your blundering brain might thing
It’s just a Shakespeare Martini babe, a Martini by the sunset.
The sun bends lazy over the blue ocean
The sea tickles the wood feet of the empty esplanade
I didn’t mean to hurt you with the murmur of my heart
When I said love was at the gate of my veins
Lovely words do no broke strengthened hearts
The heat plays distortions on my mind through the fringe of times
Flaming with the hallucination of the wind ideas flow rapidly
Do I need to hear this voice that wails upon me?
The swordfish points its syringe to a duel
Past and future clash inside remembrances and forgetfulness
Embrace me deeply my lost love, my wounded heart sinks under my feet
In the sewer where romance don’t prevail
Martini sings its melody in a colored orange sunset
Sometimes it snows in April says the lyrics
But it’s June and sunny weather never drowns
On my boozy dizzy head, my boiled water of sorrows
Do I need to ear the non-sense of a green algae upon me?
It beats; of course it beats, sprinkles the heart that pumps my veins
Its not whisky its not vodka it’s a liquor jealousy that travels in me
Bottled cruelly with the poison of your staring blue in which you endeavor so often
The arts and crafts where your disrespect blossoms
You mislead me in the use of the outrageous power of my hurtful speech
Tickling the bells of a future untold and persecuted for the sparkle of happiness
Do I need to bend like a thin oak tree to your windy desires?
I am the bunch of grapes that you step to fulfill your thirst
The distilled alcohol of a wedding party that not even the engaged couples appear
The wrist broken in a lovers fight for the need of grabbing you
Like the hug of non-slept nights we had
I am the vivid and clear overcome of the emptiness of selves
I am the leak in the ceiling of your consistency
And latent, a huge river will rise in this chain of drops
Do I hear the drip that your eyes spill in the naked concrete?
Do I?
Do I have the strength dispersed through the pasted years of togetherness?
Should I embrace the future, leaving sorrows in the shoulder pad of the door?
Should I?
Are you not tired of the mockery of your stupid games of love?
The betrayal, the stories unspoken, and the rarely lovely words said
Are you counting all of the drops that you drop in the theatre of lust?
It’s the same theatre that you mount with tons of spectacle to deceive me.
And do I worth it?
Do I?
And this is not hunger that it is speaking - as your blundering brain might thing
It’s just a Shakespeare Martini babe, a Martini by the sunset.
A pergunta
Tenho buracos de mágoas no meu coração mais parecendo uma esponja. Mas tu sabes disso. Perguntaste um dia destes quando te escreveria alguma coisa que fosse para ti. Eu sorri. Não tinha a mínima vontade de te responder. Mas também sobre isso tu sabes. E ainda, que me perguntaste logo depois o que precisarias fazer para que isso acontecesse. Sim, isso de eu escrever alguma coisa que fosse para ti e te fizesse uma qualquer cócega na alma. O que terias de fazer de tão psicologicamente intenso? Foram as tuas palavras, que usaste como um torniquete à minha paz. Sei que foi um longo silêncio o meu, e que demorou meses e quase te fez chorar de mimo. Se ainda quiseres saber, eu digo: Nada. É isso mesmo, mesmo que pareça estúpido. Não faças nada, deixa-me ser eu a fazê-lo.
Acordei nesse mesmo dia ainda antes de adormecer seriamente, envolto nos restos da embriaguez dos teus beijos, naquele turbilhão sempre louco da libido e do álcool. Como poderás ler. Foi tão bom que ainda agora me recordo do paladar perfurmado da saliva, e como nos sentimos siameses com o carinho ainda colado nas nossas bocas, agarrado a elas como uma lapa teimosa que resiste na sua rocha contra a violência das ondas. Faltou paixão, dirás tu. Pelo menos daquela bruta, que faz doer. Como tu gostas e eu gosto, daquelas paixões que apertam a alma como uma asfixia só colmatada numa qualquer metáfora de uma respiração boca-a-boca. Mas, tu sabes tão bem, se fosse dessa paixão que nós sofrêssemos, eu escrevia-te livros. Os que pudesse. Por isso eu te digo: não faças nada, mantém-te quieta. Ou então, deixa que essa paixão tola e imprevisível surja como os tornados que tudo varrem e surgem do nada. Que surja de mim para ti. Mas não te apaixones por mim. Não. Porque, a verdade é esta, em estados de felicidade não escrevo. Não escrevo e ponto final. A paixão abraça-me de tal forma que se torna impossível mover-me noutro sentido que não seja saciar essa vontade da volúpia. Embora aquela sinfonia suave dos teus beijos faça crer que tudo isso um dia seja possível.
Tenho buracos de mágoas no meu coração mais parecendo uma esponja. Mas tu sabes disso. Perguntaste um dia destes quando te escreveria alguma coisa que fosse para ti. Eu sorri. Não tinha a mínima vontade de te responder. Mas também sobre isso tu sabes. E ainda, que me perguntaste logo depois o que precisarias fazer para que isso acontecesse. Sim, isso de eu escrever alguma coisa que fosse para ti e te fizesse uma qualquer cócega na alma. O que terias de fazer de tão psicologicamente intenso? Foram as tuas palavras, que usaste como um torniquete à minha paz. Sei que foi um longo silêncio o meu, e que demorou meses e quase te fez chorar de mimo. Se ainda quiseres saber, eu digo: Nada. É isso mesmo, mesmo que pareça estúpido. Não faças nada, deixa-me ser eu a fazê-lo.
Acordei nesse mesmo dia ainda antes de adormecer seriamente, envolto nos restos da embriaguez dos teus beijos, naquele turbilhão sempre louco da libido e do álcool. Como poderás ler. Foi tão bom que ainda agora me recordo do paladar perfurmado da saliva, e como nos sentimos siameses com o carinho ainda colado nas nossas bocas, agarrado a elas como uma lapa teimosa que resiste na sua rocha contra a violência das ondas. Faltou paixão, dirás tu. Pelo menos daquela bruta, que faz doer. Como tu gostas e eu gosto, daquelas paixões que apertam a alma como uma asfixia só colmatada numa qualquer metáfora de uma respiração boca-a-boca. Mas, tu sabes tão bem, se fosse dessa paixão que nós sofrêssemos, eu escrevia-te livros. Os que pudesse. Por isso eu te digo: não faças nada, mantém-te quieta. Ou então, deixa que essa paixão tola e imprevisível surja como os tornados que tudo varrem e surgem do nada. Que surja de mim para ti. Mas não te apaixones por mim. Não. Porque, a verdade é esta, em estados de felicidade não escrevo. Não escrevo e ponto final. A paixão abraça-me de tal forma que se torna impossível mover-me noutro sentido que não seja saciar essa vontade da volúpia. Embora aquela sinfonia suave dos teus beijos faça crer que tudo isso um dia seja possível.
sexta-feira, junho 13, 2003
Mrs Fátima Felgueiras
Esta senhora de comportamento tão inédito fez que eu pedisse ajuda e estou de momento em pesquisa para fazer um pequeno texto. Creio piamente que ela sofre de alguma Perturbação da Personalidade (vou consultar o DMS- IV- R e tentar o ICD-10).
Agradecimentos à Sissi pela bibliografia!
Esta senhora de comportamento tão inédito fez que eu pedisse ajuda e estou de momento em pesquisa para fazer um pequeno texto. Creio piamente que ela sofre de alguma Perturbação da Personalidade (vou consultar o DMS- IV- R e tentar o ICD-10).
Agradecimentos à Sissi pela bibliografia!
quinta-feira, junho 12, 2003
Felgueiras
As lágrimas teimaram em não cair. Quase que se conseguia dar o golpe de teatro e, como se costuma dizer, dar a volta ao assunto. A fuga de Fátima Felgueiras pode não ter sido um bom exemplo de um cidadão exemplar, e mantendo a presunção de inocência que a todos se deve, a fuga por si só é um crime. Nem que seja moral. Mas se não foi um bom exemplo, pelo menos é um bom precendente. À imagem do enredo do último filme do Mr. Bean, onde um magnate queria conquistar um reino para o tranformar numa imensa prisão internacional, a ideia de que os nosso criminosos fujam todos para o estrangeiro parece mesmo muito boa. Os presídios estão superlotados, as finanças poupavam a sua cota parte, e nós vulgares cidadãos cumpridores dos seus deveres fiscais, não nos sentiriámos tão roubados, alguns pela segunda vez. O Brasil já tem suficientes problemas com a segurança, a corrupção e o crime violento; eu extraditava qualquer foragido à lei noutro país, mas isso é com eles, eles lá sabem. Não se pode oferecer nacionalidade brasileira a todo o criminoso que infestam a nossa sociedade?
As lágrimas teimaram em não cair. Quase que se conseguia dar o golpe de teatro e, como se costuma dizer, dar a volta ao assunto. A fuga de Fátima Felgueiras pode não ter sido um bom exemplo de um cidadão exemplar, e mantendo a presunção de inocência que a todos se deve, a fuga por si só é um crime. Nem que seja moral. Mas se não foi um bom exemplo, pelo menos é um bom precendente. À imagem do enredo do último filme do Mr. Bean, onde um magnate queria conquistar um reino para o tranformar numa imensa prisão internacional, a ideia de que os nosso criminosos fujam todos para o estrangeiro parece mesmo muito boa. Os presídios estão superlotados, as finanças poupavam a sua cota parte, e nós vulgares cidadãos cumpridores dos seus deveres fiscais, não nos sentiriámos tão roubados, alguns pela segunda vez. O Brasil já tem suficientes problemas com a segurança, a corrupção e o crime violento; eu extraditava qualquer foragido à lei noutro país, mas isso é com eles, eles lá sabem. Não se pode oferecer nacionalidade brasileira a todo o criminoso que infestam a nossa sociedade?
O Azul do Teu Mar
O pessoal do Mar Salgado parece que aproveitou o fim de semana para ir à Zambujeira do Mar. Fizeram-me saudades. Descer à Praia dos Alteirinhos, regressar da praia e ir ao bar do Ti Manel comer uns camarões e beber umas cervejas, jantar um peixinho no restaurante da Rita, beber umas caipinhas no Bar do Carlos e acabar a noite no Clube da Praia é uma rotina extremamente familiar e da qual tenho uma certa saudade. Fica aqui uma história em que a semelhança com acontecimentos reais não será uma total coincidência...
O azul do teu mar
Entrou no bar eram umas duas da manhã. Distribuia sorrisos a todos, ignorando o ciume miudinho que me corroia por dentro. Vestia de vermelho como na primeira vez que a vi, faz este mês de Agosto um ano. Outra vez o mesmo destino de férias. Mas sabe bem reencontrar caras conhecidas e tudo na mesma, faz-me sentir em casa. É isso que me faz voltar cá. Deixo os meus amigos e dirijo-me ao bar aonde ela foi buscar uma bebida. Temos o mesmo hábito de bebida, mas hoje em dia toda a gente bebe a mesma coisa, e não é isso que nos identifica. Continuo a procura de coisas comuns entre nós sem saber muito bem para quê, nem a quê que isso me leva. Fico só suficientemente perto dela para poder ouvir a sua voz. Tenho esta mania das vozes, das mãos e dos sapatos, de observar as pessoas e construir teorias sobre quem são com estes dados. O teste final é o toque. Pode destruir tudo. Todas as terorias e todas as emoções que pernoitam na alma. Oiço-a descrever a tarde de praia que teve, as brincadeiras que fizeram, as piadas que contaram, os banhos que contaram. Gosto destas raparigas com este poder descricionário, como uma pintura hiper-realista onde o detalhe sobressai da paisagem em pinceladas naturais. Eu sou um impressionista, só um quadro complexo de ideias que dificilmente vou conseguir relatar. Já quase não me lembro da minha tarde de praia. Ficaram pinceladas de coisas como fantasmas que passeiam dentro de um quadro azul. Gosto deste bar ao ar livre, com uma cobertura de palha, com a sua musica própria de ritmos latinos que contrasta com a musica house que percorre os ouvidos das pessoas que dançam dentro da zona coberta. Eu fico de longe a observa-los, enquanto continuo a ouvi-la contar histórias. Vivemos na era da informação, penso eu como desculpa da minha atitude invasiva. Não resisto muito tempo à minha consciência e volto para junto dos meus amigos. Faço um esforço minimo para que os meus olhos se cruzem com os dela mas o momento não nos pertence. Chamo-me de covarde três vezes e nem sequer discuto comigo mesmo. Normalmente digo que sou tímido mas eu sei que no fundo sou mesmo covarde. O medo de rejeição faz parte da minha constituição sanguínea. O que eu precisava era de uma transfusão da alegria dela e não deste sentido ilusório que o alcool da mistura feita no copo provoca. Vagueio durante umas horas entre os meus amigos, pessoas que vou conhecendo, o bar e um sentido posicional estratégico que dá sempre para os seus olhos azuis, estrelas cintilantes no céu escuro da noite. Estrelas que me guiam, fárois que marcam a posição perigosa das escarpas onde certamente naufragava. Há um sentido metafisico no mundo, o qual se pode provar a sua existência; gosto de fixar o meu olhar nela mesmo quando ela está de costas para mim. Fico ali, até ela se virar de incomodada e olhar directamente para os meus olhos, como se soubesse que eu a olhava. E sabia, com um saber que ultrapassa a noção Física. Eu acovardava-me ainda mais, baixava os olhos e perdia a força de lutar. O bar funcionava outra vez como ponto de fuga de uma perspectiva que principiava a desfocar-se.
O pessoal do Mar Salgado parece que aproveitou o fim de semana para ir à Zambujeira do Mar. Fizeram-me saudades. Descer à Praia dos Alteirinhos, regressar da praia e ir ao bar do Ti Manel comer uns camarões e beber umas cervejas, jantar um peixinho no restaurante da Rita, beber umas caipinhas no Bar do Carlos e acabar a noite no Clube da Praia é uma rotina extremamente familiar e da qual tenho uma certa saudade. Fica aqui uma história em que a semelhança com acontecimentos reais não será uma total coincidência...
O azul do teu mar
Entrou no bar eram umas duas da manhã. Distribuia sorrisos a todos, ignorando o ciume miudinho que me corroia por dentro. Vestia de vermelho como na primeira vez que a vi, faz este mês de Agosto um ano. Outra vez o mesmo destino de férias. Mas sabe bem reencontrar caras conhecidas e tudo na mesma, faz-me sentir em casa. É isso que me faz voltar cá. Deixo os meus amigos e dirijo-me ao bar aonde ela foi buscar uma bebida. Temos o mesmo hábito de bebida, mas hoje em dia toda a gente bebe a mesma coisa, e não é isso que nos identifica. Continuo a procura de coisas comuns entre nós sem saber muito bem para quê, nem a quê que isso me leva. Fico só suficientemente perto dela para poder ouvir a sua voz. Tenho esta mania das vozes, das mãos e dos sapatos, de observar as pessoas e construir teorias sobre quem são com estes dados. O teste final é o toque. Pode destruir tudo. Todas as terorias e todas as emoções que pernoitam na alma. Oiço-a descrever a tarde de praia que teve, as brincadeiras que fizeram, as piadas que contaram, os banhos que contaram. Gosto destas raparigas com este poder descricionário, como uma pintura hiper-realista onde o detalhe sobressai da paisagem em pinceladas naturais. Eu sou um impressionista, só um quadro complexo de ideias que dificilmente vou conseguir relatar. Já quase não me lembro da minha tarde de praia. Ficaram pinceladas de coisas como fantasmas que passeiam dentro de um quadro azul. Gosto deste bar ao ar livre, com uma cobertura de palha, com a sua musica própria de ritmos latinos que contrasta com a musica house que percorre os ouvidos das pessoas que dançam dentro da zona coberta. Eu fico de longe a observa-los, enquanto continuo a ouvi-la contar histórias. Vivemos na era da informação, penso eu como desculpa da minha atitude invasiva. Não resisto muito tempo à minha consciência e volto para junto dos meus amigos. Faço um esforço minimo para que os meus olhos se cruzem com os dela mas o momento não nos pertence. Chamo-me de covarde três vezes e nem sequer discuto comigo mesmo. Normalmente digo que sou tímido mas eu sei que no fundo sou mesmo covarde. O medo de rejeição faz parte da minha constituição sanguínea. O que eu precisava era de uma transfusão da alegria dela e não deste sentido ilusório que o alcool da mistura feita no copo provoca. Vagueio durante umas horas entre os meus amigos, pessoas que vou conhecendo, o bar e um sentido posicional estratégico que dá sempre para os seus olhos azuis, estrelas cintilantes no céu escuro da noite. Estrelas que me guiam, fárois que marcam a posição perigosa das escarpas onde certamente naufragava. Há um sentido metafisico no mundo, o qual se pode provar a sua existência; gosto de fixar o meu olhar nela mesmo quando ela está de costas para mim. Fico ali, até ela se virar de incomodada e olhar directamente para os meus olhos, como se soubesse que eu a olhava. E sabia, com um saber que ultrapassa a noção Física. Eu acovardava-me ainda mais, baixava os olhos e perdia a força de lutar. O bar funcionava outra vez como ponto de fuga de uma perspectiva que principiava a desfocar-se.
terça-feira, junho 10, 2003
Recessão
A blogosfera depois de um surto qual baby-boom do qual também nós participamos, entrou em recessão. Quando se julgava que se ia dar uma nova elevação à máxima de Descartes "Penso, blogo existo", eis que alguns blogs fecham as suas portas e outros primam pela ausência e silêncio continuado. O Verão e as férias estão por ai para agravar a situação. E por aqui que já está tão quente....
A blogosfera depois de um surto qual baby-boom do qual também nós participamos, entrou em recessão. Quando se julgava que se ia dar uma nova elevação à máxima de Descartes "Penso, blogo existo", eis que alguns blogs fecham as suas portas e outros primam pela ausência e silêncio continuado. O Verão e as férias estão por ai para agravar a situação. E por aqui que já está tão quente....
Aracnídeos
Tenho dois intrigantes exemplares destes no tecto da minha casa de banho. Estão sempre no mesmo sítio, tão inamovíveis que já os julguei mortos, mas um esgar mais atento permitiu detectar-lhes movimento. Não sei do que se alimentam, raramente há outros insectos de visita lá por casa. Eu gosto de aranhas, por isso tenho uma convivência pacífica com elas. Ainda por cima são tão limpinhas que não fazem teias. Será que são do SIS, da PJ? Será que uma delas se vai transformar na Kirsten Dunst? A minha mãe diz que eu devia arranjar uma miúda com tendências de serial killer de insectos. Oh mãe! Eu juro que já tentei! Ando sempre com a esperança de que a visita da profissional doméstica me passe uma vassourada no assunto. Há tanta coisa que se podia resolver num ápice e com limpeza...
Tenho dois intrigantes exemplares destes no tecto da minha casa de banho. Estão sempre no mesmo sítio, tão inamovíveis que já os julguei mortos, mas um esgar mais atento permitiu detectar-lhes movimento. Não sei do que se alimentam, raramente há outros insectos de visita lá por casa. Eu gosto de aranhas, por isso tenho uma convivência pacífica com elas. Ainda por cima são tão limpinhas que não fazem teias. Será que são do SIS, da PJ? Será que uma delas se vai transformar na Kirsten Dunst? A minha mãe diz que eu devia arranjar uma miúda com tendências de serial killer de insectos. Oh mãe! Eu juro que já tentei! Ando sempre com a esperança de que a visita da profissional doméstica me passe uma vassourada no assunto. Há tanta coisa que se podia resolver num ápice e com limpeza...
Antipátias irracionais
O zapping obrigou-me a dar de caras com a Meryl Streep. Tenho uma antipátia irracional pela figura que me recuso a definir e por isso mesmo explicar. Támbem sinto o mesmo pela Glenn Close, a Barbara Streisand, e pela Cher. Há quem diga que é pelo nariz que elas têm. Mas no casa da Mónica Selles toda a gente sabe que é pelos gritinhos irritantes durante os matches, o nariz é uma questão de pormenor.
O zapping obrigou-me a dar de caras com a Meryl Streep. Tenho uma antipátia irracional pela figura que me recuso a definir e por isso mesmo explicar. Támbem sinto o mesmo pela Glenn Close, a Barbara Streisand, e pela Cher. Há quem diga que é pelo nariz que elas têm. Mas no casa da Mónica Selles toda a gente sabe que é pelos gritinhos irritantes durante os matches, o nariz é uma questão de pormenor.
As palavras são importantes
Nunca gostei muito de política. Num soube nada de politica. Sempre me ri dos políticos. Aprendi a gostar mais de política e a enquadrar-me melhor nesse espectro que vai do extremo-esquerdo ao extremo-direito na Coluna Infame. Agora caiu um dos pilares da blogosfera portuguesa. Como disse o João Pereira Coutinho as palavras são importantes, e foi pelas palavras cativantes de João Pereira Coutinho, de Pedro Mexia e de Pedro Lomba que a politica ganhou um pendor artistico, humano e próximo, posso assim dizer. Sim, as palavras são importantes. Não que eu compartilhe dos valores desses autores, nem que discorde sempre. Sempre disse pertencer a um partido virtual que chamei de Politica 3D por brincadeira. De cima vê-se melhor, e porque há coisas mais importantes do que política. Os membros da Coluna Infame provaram isso. O que torna a perda desse agradável espaço de leitura e de saber, elevada ainda de uma maior pena. Dó. Que uma outra música nos encante agora.
Nunca gostei muito de política. Num soube nada de politica. Sempre me ri dos políticos. Aprendi a gostar mais de política e a enquadrar-me melhor nesse espectro que vai do extremo-esquerdo ao extremo-direito na Coluna Infame. Agora caiu um dos pilares da blogosfera portuguesa. Como disse o João Pereira Coutinho as palavras são importantes, e foi pelas palavras cativantes de João Pereira Coutinho, de Pedro Mexia e de Pedro Lomba que a politica ganhou um pendor artistico, humano e próximo, posso assim dizer. Sim, as palavras são importantes. Não que eu compartilhe dos valores desses autores, nem que discorde sempre. Sempre disse pertencer a um partido virtual que chamei de Politica 3D por brincadeira. De cima vê-se melhor, e porque há coisas mais importantes do que política. Os membros da Coluna Infame provaram isso. O que torna a perda desse agradável espaço de leitura e de saber, elevada ainda de uma maior pena. Dó. Que uma outra música nos encante agora.
segunda-feira, junho 09, 2003
Turvo
Questionava-se sempre porque estariam todos condicionados pela esperança de encontrarem alguém com quem partilhar tudo. Achava absurdo este preceito restritivo, parecia-lhe demasiado simplista, ainda primário. Dizia sempre que não se tratava de um requesito verdadeiramente espiritual, esta busca de um par, era muito mais uma circunspecção à ordem natural da perpetuação da espécie. Não tinha esperança no futuro. Tinha as certezas do passado. E isso parecia bastar para complementar a sua existência. Os laços sempre se apresentaram como redutores, mesmo castradores da evolução que procurava. Mas nem todos os dia pensava assim. Ainda vivia alguns dias que descrevia como pautados pelo romanticismo lírico de uma imagem, o casal. Nestes dias em que toda a tristeza do mundo parecia cair na sua alma, via o mundo como abstrato, indefinido. A tendência era para actuar como o mundo se lhe apesentava, tirava as lentes e ficava maravilhada pela doce névoa que passava a existir em redor. Tudo deixava de a afectar, estava cercada por vultos, contornos coloridos que se deslocavam fantasmagóricamente, sem definição concreta. Mas sabia que esta situação era passageira, quando voltasse a estar no mundo como igual, sabia que continuaria só. E não se importava.
Questionava-se sempre porque estariam todos condicionados pela esperança de encontrarem alguém com quem partilhar tudo. Achava absurdo este preceito restritivo, parecia-lhe demasiado simplista, ainda primário. Dizia sempre que não se tratava de um requesito verdadeiramente espiritual, esta busca de um par, era muito mais uma circunspecção à ordem natural da perpetuação da espécie. Não tinha esperança no futuro. Tinha as certezas do passado. E isso parecia bastar para complementar a sua existência. Os laços sempre se apresentaram como redutores, mesmo castradores da evolução que procurava. Mas nem todos os dia pensava assim. Ainda vivia alguns dias que descrevia como pautados pelo romanticismo lírico de uma imagem, o casal. Nestes dias em que toda a tristeza do mundo parecia cair na sua alma, via o mundo como abstrato, indefinido. A tendência era para actuar como o mundo se lhe apesentava, tirava as lentes e ficava maravilhada pela doce névoa que passava a existir em redor. Tudo deixava de a afectar, estava cercada por vultos, contornos coloridos que se deslocavam fantasmagóricamente, sem definição concreta. Mas sabia que esta situação era passageira, quando voltasse a estar no mundo como igual, sabia que continuaria só. E não se importava.
Não é preciso inventar ninguém
Quando ela mudou de residência nunca mais a voltou a ver. Não que estivessem irremediavelmente longe um do outro mas porque a vida é assim mesmo e nem sempre faz a vontade aos amantes. Não que eles alguma vez o fossem ou tivessem sido. Embora na cabeça dele, quando uma leve nostalgia sem origem definida o apanhava, ele achasse que podiam ter sido. Até mesmo que o deviam ter sido. Pelo menos era essa a vontade que ele julgava ter. Essa dúvida que nem era só dele, sim, que ela muitas vezes se sentiu impelida a beijar-lhe os lábios como se isso fosse a marca de uma revolução qualquer, só existia porque ela perguntava-lhe muitas vezes se ele não estaria a inventar aquela paixão. Ela não sabia que era a sua própria dúvida que falava por ela. Ele respondia-lhe invariavelmente que não, que não tinha sido preciso inventar ninguém para que o seu coração se pusesse a pular sempre que a via, e muitas vezes mesmo bastava a imagem dela lhe sobrevoar os sonhos. Essa emoção tão indefinida que era constantemente adornada entre a moldura de um medo inexplicável e um quadro recheado de fantasia.
Era sempre ela que tomava a iniciativa de telefonar, nunca de forma regular e muito menos assídua. Ele escrevia-lhe cartas, todas as semanas. Cartas compridas que deixavam o seu coração falar baixinho, numa conversa mantida num sussuro que só as palavras contidas pelo medo conseguem. No principio do mês escrevia-lhe uma carta especial, uma carta como as outras mas onde ele podia abrir a torneira do medo e mostrar-se gentil. Já para não mencionar a ocasião única dos anos dela. Todos os anos no mesmo dia em que se iniciava o Verão. Eram sempre cartas de idolatria que ele dizia sempre para não serem levadas a sério. Ela acreditava.
A eles não lhes importava que não se vissem todos os dias, diziam que eram a companhia um do outro e que isso bastava. Mesmo que, no fundo, essa situação não satisfizesse nenhum deles. Foi ele o último a confessar, mas foi isso que fez entristecer Rita.
Quando ela mudou de residência nunca mais a voltou a ver. Não que estivessem irremediavelmente longe um do outro mas porque a vida é assim mesmo e nem sempre faz a vontade aos amantes. Não que eles alguma vez o fossem ou tivessem sido. Embora na cabeça dele, quando uma leve nostalgia sem origem definida o apanhava, ele achasse que podiam ter sido. Até mesmo que o deviam ter sido. Pelo menos era essa a vontade que ele julgava ter. Essa dúvida que nem era só dele, sim, que ela muitas vezes se sentiu impelida a beijar-lhe os lábios como se isso fosse a marca de uma revolução qualquer, só existia porque ela perguntava-lhe muitas vezes se ele não estaria a inventar aquela paixão. Ela não sabia que era a sua própria dúvida que falava por ela. Ele respondia-lhe invariavelmente que não, que não tinha sido preciso inventar ninguém para que o seu coração se pusesse a pular sempre que a via, e muitas vezes mesmo bastava a imagem dela lhe sobrevoar os sonhos. Essa emoção tão indefinida que era constantemente adornada entre a moldura de um medo inexplicável e um quadro recheado de fantasia.
Era sempre ela que tomava a iniciativa de telefonar, nunca de forma regular e muito menos assídua. Ele escrevia-lhe cartas, todas as semanas. Cartas compridas que deixavam o seu coração falar baixinho, numa conversa mantida num sussuro que só as palavras contidas pelo medo conseguem. No principio do mês escrevia-lhe uma carta especial, uma carta como as outras mas onde ele podia abrir a torneira do medo e mostrar-se gentil. Já para não mencionar a ocasião única dos anos dela. Todos os anos no mesmo dia em que se iniciava o Verão. Eram sempre cartas de idolatria que ele dizia sempre para não serem levadas a sério. Ela acreditava.
A eles não lhes importava que não se vissem todos os dias, diziam que eram a companhia um do outro e que isso bastava. Mesmo que, no fundo, essa situação não satisfizesse nenhum deles. Foi ele o último a confessar, mas foi isso que fez entristecer Rita.
domingo, junho 08, 2003
sábado, junho 07, 2003
A resposta do tempo
Apetece-me esconder-te do mundo.
Parar o tempo nas nove de horas de uma das manhãs mais frias que me ocorre lembrar, a minha mão a segurar na tua sem podermos sentir o tacto da pele, impedidos pelas luvas que nos negavam o aconchego. A luz dos teus olhos entrando nos meus, no mesmo tom e brilho do céu azul e já luminoso da manhã. Parava os relógios do mundo e celebrava o momento com um beijo nos teus lábios de vermelho e riso. Se me fosse permitido. Se fosse uma vontade também tua. Mas, talvez o frio congelasse a acção e eu, não mais do que uma covardia exposta, encalhava nos teus olhos de mar. Mas o tempo não parava nem mesmo que eu forçasse um silêncio sobre ti. A tua mão fugia sobre a minha como um adeus que viria a seguir. Eu deslizava pelos segundos amarrado ainda à maré vibrante dos teus olhos de mar.
É tudo mentira.
Eu queria que o tempo corresse, lentamente sim, mas que me desses a mão ainda com mais força, que a tua mão deslizasse sobre a minha como uma carícia sem tempo nem limite de tempo. Que os teus olhos se fechassem como quando se fecham na esperança de um beijo que nos ilumina o interior. Que o beijo sossegasse o sofrer da alma como se um sol novo e de verão surgisse por dentro e virasse o sentir do avesso. Que a tua beleza me mostrasse uma outra forma de acordar. Uma outra forma de adormecer. Que o teu riso fosse um despertador do tédio do quotidiano. Que todas as ilusões que criaste em mim fossem apenas as verdades do tempo futuro, que vagueando na maré dos teus olhos de mar, deixei acovardadas na resposta do tempo de dizer adeus.
Apetece-me esconder-te do mundo.
Parar o tempo nas nove de horas de uma das manhãs mais frias que me ocorre lembrar, a minha mão a segurar na tua sem podermos sentir o tacto da pele, impedidos pelas luvas que nos negavam o aconchego. A luz dos teus olhos entrando nos meus, no mesmo tom e brilho do céu azul e já luminoso da manhã. Parava os relógios do mundo e celebrava o momento com um beijo nos teus lábios de vermelho e riso. Se me fosse permitido. Se fosse uma vontade também tua. Mas, talvez o frio congelasse a acção e eu, não mais do que uma covardia exposta, encalhava nos teus olhos de mar. Mas o tempo não parava nem mesmo que eu forçasse um silêncio sobre ti. A tua mão fugia sobre a minha como um adeus que viria a seguir. Eu deslizava pelos segundos amarrado ainda à maré vibrante dos teus olhos de mar.
É tudo mentira.
Eu queria que o tempo corresse, lentamente sim, mas que me desses a mão ainda com mais força, que a tua mão deslizasse sobre a minha como uma carícia sem tempo nem limite de tempo. Que os teus olhos se fechassem como quando se fecham na esperança de um beijo que nos ilumina o interior. Que o beijo sossegasse o sofrer da alma como se um sol novo e de verão surgisse por dentro e virasse o sentir do avesso. Que a tua beleza me mostrasse uma outra forma de acordar. Uma outra forma de adormecer. Que o teu riso fosse um despertador do tédio do quotidiano. Que todas as ilusões que criaste em mim fossem apenas as verdades do tempo futuro, que vagueando na maré dos teus olhos de mar, deixei acovardadas na resposta do tempo de dizer adeus.
O estado das coisas
A música tocava em decibéis impróprios, os corpos balanceavam tropegos, as bolas nas paredes dançavam e tu acompanhavas tudo num ritmo cadeado.
Era difícil entender o que te rodeava, falavam contigo e acenavas com a concordância dos que não querem saber. Era nestas alturas que eu gostava de estar a acompanhar o teu pensamento. Nunca entendi as tuas razões, mas creio que era isso que me fazia depender tanto de ti. Porcuravas sempre algo que não estava, alguém que não existia, e fazias assim que tudo e todos se prendessem ao teu mundo. Por muito que se aproximassem o máximo que conseguiam era o desdém mais simpático, a negação mais abstrata, só perceptivel a quem se dignasse a aprofundar o que o teu sorriso deixava entender. Nem o estudo mais elaborado feito à Mona Lisa seria capaz de qualificar o teu sorriso. O enigma estava presente e no entanto parecia que se apagava nos rostos dos demais. Num instante o mundo pertencia-nos e ninguém tinha conhecimento dessa estranha forma de ligação. Como seria possível dois rostos terem algo de comum? A linha imaginária estava traçada e inquebravel para este mundo.
Jamais se repetiria, o fim não existia. Espero, olho, recordo. Vejo o teu olhar chocar no meu e num instante zonzo, sem forças para desviar os meus olhos, fico paralizada de terror. Eras aquele que eu esperava e já o sabia, assim como tu tinhas a mesma certeza. Avancei, despedi-me de todos e fui-me embora. Nunca se deve enfrentar o destino.
A música tocava em decibéis impróprios, os corpos balanceavam tropegos, as bolas nas paredes dançavam e tu acompanhavas tudo num ritmo cadeado.
Era difícil entender o que te rodeava, falavam contigo e acenavas com a concordância dos que não querem saber. Era nestas alturas que eu gostava de estar a acompanhar o teu pensamento. Nunca entendi as tuas razões, mas creio que era isso que me fazia depender tanto de ti. Porcuravas sempre algo que não estava, alguém que não existia, e fazias assim que tudo e todos se prendessem ao teu mundo. Por muito que se aproximassem o máximo que conseguiam era o desdém mais simpático, a negação mais abstrata, só perceptivel a quem se dignasse a aprofundar o que o teu sorriso deixava entender. Nem o estudo mais elaborado feito à Mona Lisa seria capaz de qualificar o teu sorriso. O enigma estava presente e no entanto parecia que se apagava nos rostos dos demais. Num instante o mundo pertencia-nos e ninguém tinha conhecimento dessa estranha forma de ligação. Como seria possível dois rostos terem algo de comum? A linha imaginária estava traçada e inquebravel para este mundo.
Jamais se repetiria, o fim não existia. Espero, olho, recordo. Vejo o teu olhar chocar no meu e num instante zonzo, sem forças para desviar os meus olhos, fico paralizada de terror. Eras aquele que eu esperava e já o sabia, assim como tu tinhas a mesma certeza. Avancei, despedi-me de todos e fui-me embora. Nunca se deve enfrentar o destino.
sexta-feira, junho 06, 2003
quinta-feira, junho 05, 2003
Lara
Tinha três anos quando me encontrou embrulhado num manto de lã ao xadrez castanho com tiras cor de mel e uma muito fina de um vermelho velho e pálido. Reparou que eu tinha os olhos muito azuis tão claros como o céu no melhor dia de verão e pensou logo que eu seria o amor da sua vida. Foi isto o que me disse catorze anos depois. Foi nessa altura, e não tinha eu ainda quinze anos, que me apercebi o que era sofrer da tentação feminina. Tínhamos sido criados como irmão, diziam. Mas lá em casa ninguém se tinha apercebido disso. A minha mãe adoptiva, que eu adoptei por imposição, chamou-me Sebastião. Não por ter aparecido entre dois abetos muito verdes e eu, com os meus olhitos muito azuis, a fazer-me ver por entre o nevoeiro, como eu cheguei a pensar um dia numa aula de história, mas porque o irmão da minha mãe adoptiva tinha falecido um ano antes de eu ser encontrado entre a verdura dos abetos no parque infantil e também se chamava Sebastião. Foi quando soube desta história que finalmente percebi o arrebatamento que lhe tinha assomado o coração no momento que me encontrou. Adoptou-me de facto durante duas semanas, até que os meus olhos azuis começaram a fazer-lhe confusão no meio daqueles olhares castanhos e baços do resto da família. Excepto os de Lara. Lara tinha os olhos negros, a pele mestiça, macia e sorridente como um ursinho de pelúcia. Era muito estranho isso da cor da pele da Lara já que o resto da família tinha a pele tão branquinha. Até cheguei a perguntar ao meu pai adoptivo se a Lara também tinha sido encontrada. O meu pai adoptivo só me disse que a Lara era uma filha da mãe, coisa que mesmo na minha idade, tinha eu oito anos, já sabia que era um insulto e facilmente percebi que era devido às travessuras que ela fazia. A minha Lara. Uma noite de verão como tantas outras que eu vivi, eu e a Lara fugimos, não por uma aventura romântica com o luar a banhar os nossos corpos fugidos, mas porque o meu pai adoptivo chegou a casa uns cinco copos de bagaço bem servidos mais aceso do que o costume, e desatou aos tabefes e pontapés aos outros branquelas da família a perguntar pela negra, que eu imaginei logo ser a Lara, e ela, que ficou imóvel apenas a tilintar de medo como se estivesse com frio. Metido a héroi de histórias que já tinha ouvido contar, dei-lhe a mão e foi pela porta dos fundos da cozinha que saímos. Eu com os meus olhitos muito azuis a alumiar a estrada escura toda ela feita de noite, e foi com eles e com as mãos dadas de Lara que descobrimos um celeiro com a porta aberta como se anunciasse uma salvação, lá do outro lado da aldeia e aí nos abrigamos. Demoramos mais de um dia a ser encontrados e foi durante esse tempo que a Lara me contou pormenores da minha infância que eu não sabia, e que, embora ela fosse muito nova para saber ou perceber, eu acreditava porque ela tinha muita imaginação. Foi nesse celeiro escuro com um odor seco a verão e a mofo de feno que a Lara me disse que eu era o amor da vida dela e como ela soube logo disso. Ficou a olhar para mim e eu percebi como eram negros e inteligentes os seus olhos, com a sua corzinha de café com leite e fofa feita o meu ursinho de pelúcia que ganhei numa feira. Na verdade roubei, mas contei a todos que um senhor velhinho e simpático me ofereceu. Tinha cinco anos e aprendia a fazer estas coisas com a filha da mãe da Lara. A ela não menti. A ela não lhe mentia eu. A minha Lara. Aos cinco anos já me dizia que não éramos irmãos, que eu não tinha irmãos, que eu não tinha pais, que nunca tinha tido pais, que ela me tinha encontrado a rir pelos olhos azuis no meio do nevoeiro metido entre os abetos que tilintavam como sininhos de embalar, que eu não tivesse medo porque eu tinha a Lara. Foi assim que nos tornámos inseparáveis. Estas coisas todas que eu não recordo da minha infância, foram sempre contadas pela Lara, que sabia de tudo, que tinha visto tudo com aqueles olhinhos negros que ficam com tudo o que vêem e por isso eles são negros como os buracos cósmicos. Esta aprendi eu numa aula de física. E foi nesse dia que aprendi que os meus, por serem tão azuis e tão límpidos nunca apanhavam nada por muito que vissem. Foi assim que passei a acreditar em Lara e só em Lara. Ela tinha a verdade do Universo nos olhos. Porque só Lara ficava com tudo o que via. Lara, a mestiça, foi encontrada e sovada e ficou três dias de cama. Eu fiquei de castigo sem comer durante dois dias, o que até não era grande castigo porque já estava habituado. Lara, a mestiça, foi encontrada porque ninguém a queria nas suas casas. Acho que era por causa daquela corzinha de café acabado de fazer e dissolvido no leite, coisa que quando havia lá em casa eu adorava beber. Mas nunca perguntei se eu tinha ou não razão. Esperava que Lara me dissesse, os olhos de Lara que viam tudo, haviam de ver isso por mim. De qualquer maneira, eu estava de castigo e também não podia falar. Chegaram as festas do santo devoto da freguesia vizinha e os branquelas como eu, só que sem olhos azuis, foram embora sete dias que contei-os eu, embora a Lara dissesse que tinham ido uma semana, que tinha-lhe dito a mãe dela. A mim e à Lara deixaram-nos comida para comer dia não/sim, o que dava-nos para comer três em sete dias, o que se podia considerar um luxo em certas épocas que, segundo os olhos de Lara, aconteciam na exacta altura em que o meu pai adoptivo chegava mais vezes aceso a casa. E lá ficamos nós, trancados em casa e sem poder sair porque os vizinhos não podiam imaginar que nos tinham deixado sozinhos, nós que éramos menores, coisa que era fácil de perceber mesmo para um rapazito de olhos azuis como eu. Pelo menos essa coisa de sermos menores, pelo menos eu, que dava pelo queixo da Lara. O queixo da Lara, as mão da Lara, as pernas da Lara, os seios da Lara… sim, foi nesses sete dias que eu vi Lara nua e percebi o que era uma mulher. Creio que nesse dia os meus olhos ficaram um pouco mais escuros porque nunca me esqueci do corpo chocolate da Lara. Tinha quinze anos menos dois dias, mais os seis meses aproximados que ninguém sabia ao certo se eu tinha. Tinha portanto uma idade aproximada de quinze anos e meio. Era uma equação, termo matemático que aprendi numa aula, difícil de fazer mas que eu já fazia com à-vontade de tantas vezes me perguntarem a idade, e em que eu, sempre a evitar mostrar a minha ignorância, respondia em valores aproximados o que fazia rir as pessoas. A Lara disse-me, com a sabedoria dos seus olhinhos inteligentes de tão negros, para eu não ligar e eu nunca mais liguei. Fazia tudo o que ela me dizia só para me sentir um filho da mãe como ela. Nos três anos seguintes o que fiz, tudo o que fiz foi apaixonar-me pela Lara. A minha Lara do sorriso de luz, tão branco no meio daquele corpo doce de chocolate. Uma noite eu dei a mão a Lara metido a heroi de outrora, e pela porta dos fundos da cozinha, com os olhinhos abertos a iluminar mais do que o luar a noite, corremos os dois em silêncio para não despertar os branquelas ressonadores e deitamo-nos os dois outra vez no celeiro. Eu de olhos fechados para não acordar Lara, e Lara a ver tudo, as estrelas e a lua e a dizer-me como aquilo era tão bonito com aquele cheiro seco a feno e o odor quente da terra de verão. Tinha a idade aproximada de dezoito anos e meio e tudo começou a fazer sentido, isso de eu ser o amor da vida dela e ela ser o amor da minha. Tudo isso fez sentido quando misturamos os nossos corpos como quando o café se misturava no leite na refeição da manhã. A minha Lara de pelúcia. Como da vez que fugimos quando o meu pai adoptivo se acendeu demasiado, fomos encontrados. Não como viemos ao mundo, não, que eu vim ao mundo envolto num manto de lã ao xadrez castanho com tiras cor de mel e uma muito fina de um vermelho velho e pálido. Meteram-nos fora de casa porque éramos dois irmãos incestuosos. A princípio ficamos apreensivos, mas depois a Lara, com os seus olhinhos negros de inteligência, rasgou um sorriso ainda mais filho da mãe do que os outros e disse-me num falso desconsolo: Agora que nos consideram parte da família é que nos põem de cá para fora. Eu pensei que a Lara era mesmo filha da mãe, e tudo o que eu sempre quis foi ser isso mesmo.
Tinha três anos quando me encontrou embrulhado num manto de lã ao xadrez castanho com tiras cor de mel e uma muito fina de um vermelho velho e pálido. Reparou que eu tinha os olhos muito azuis tão claros como o céu no melhor dia de verão e pensou logo que eu seria o amor da sua vida. Foi isto o que me disse catorze anos depois. Foi nessa altura, e não tinha eu ainda quinze anos, que me apercebi o que era sofrer da tentação feminina. Tínhamos sido criados como irmão, diziam. Mas lá em casa ninguém se tinha apercebido disso. A minha mãe adoptiva, que eu adoptei por imposição, chamou-me Sebastião. Não por ter aparecido entre dois abetos muito verdes e eu, com os meus olhitos muito azuis, a fazer-me ver por entre o nevoeiro, como eu cheguei a pensar um dia numa aula de história, mas porque o irmão da minha mãe adoptiva tinha falecido um ano antes de eu ser encontrado entre a verdura dos abetos no parque infantil e também se chamava Sebastião. Foi quando soube desta história que finalmente percebi o arrebatamento que lhe tinha assomado o coração no momento que me encontrou. Adoptou-me de facto durante duas semanas, até que os meus olhos azuis começaram a fazer-lhe confusão no meio daqueles olhares castanhos e baços do resto da família. Excepto os de Lara. Lara tinha os olhos negros, a pele mestiça, macia e sorridente como um ursinho de pelúcia. Era muito estranho isso da cor da pele da Lara já que o resto da família tinha a pele tão branquinha. Até cheguei a perguntar ao meu pai adoptivo se a Lara também tinha sido encontrada. O meu pai adoptivo só me disse que a Lara era uma filha da mãe, coisa que mesmo na minha idade, tinha eu oito anos, já sabia que era um insulto e facilmente percebi que era devido às travessuras que ela fazia. A minha Lara. Uma noite de verão como tantas outras que eu vivi, eu e a Lara fugimos, não por uma aventura romântica com o luar a banhar os nossos corpos fugidos, mas porque o meu pai adoptivo chegou a casa uns cinco copos de bagaço bem servidos mais aceso do que o costume, e desatou aos tabefes e pontapés aos outros branquelas da família a perguntar pela negra, que eu imaginei logo ser a Lara, e ela, que ficou imóvel apenas a tilintar de medo como se estivesse com frio. Metido a héroi de histórias que já tinha ouvido contar, dei-lhe a mão e foi pela porta dos fundos da cozinha que saímos. Eu com os meus olhitos muito azuis a alumiar a estrada escura toda ela feita de noite, e foi com eles e com as mãos dadas de Lara que descobrimos um celeiro com a porta aberta como se anunciasse uma salvação, lá do outro lado da aldeia e aí nos abrigamos. Demoramos mais de um dia a ser encontrados e foi durante esse tempo que a Lara me contou pormenores da minha infância que eu não sabia, e que, embora ela fosse muito nova para saber ou perceber, eu acreditava porque ela tinha muita imaginação. Foi nesse celeiro escuro com um odor seco a verão e a mofo de feno que a Lara me disse que eu era o amor da vida dela e como ela soube logo disso. Ficou a olhar para mim e eu percebi como eram negros e inteligentes os seus olhos, com a sua corzinha de café com leite e fofa feita o meu ursinho de pelúcia que ganhei numa feira. Na verdade roubei, mas contei a todos que um senhor velhinho e simpático me ofereceu. Tinha cinco anos e aprendia a fazer estas coisas com a filha da mãe da Lara. A ela não menti. A ela não lhe mentia eu. A minha Lara. Aos cinco anos já me dizia que não éramos irmãos, que eu não tinha irmãos, que eu não tinha pais, que nunca tinha tido pais, que ela me tinha encontrado a rir pelos olhos azuis no meio do nevoeiro metido entre os abetos que tilintavam como sininhos de embalar, que eu não tivesse medo porque eu tinha a Lara. Foi assim que nos tornámos inseparáveis. Estas coisas todas que eu não recordo da minha infância, foram sempre contadas pela Lara, que sabia de tudo, que tinha visto tudo com aqueles olhinhos negros que ficam com tudo o que vêem e por isso eles são negros como os buracos cósmicos. Esta aprendi eu numa aula de física. E foi nesse dia que aprendi que os meus, por serem tão azuis e tão límpidos nunca apanhavam nada por muito que vissem. Foi assim que passei a acreditar em Lara e só em Lara. Ela tinha a verdade do Universo nos olhos. Porque só Lara ficava com tudo o que via. Lara, a mestiça, foi encontrada e sovada e ficou três dias de cama. Eu fiquei de castigo sem comer durante dois dias, o que até não era grande castigo porque já estava habituado. Lara, a mestiça, foi encontrada porque ninguém a queria nas suas casas. Acho que era por causa daquela corzinha de café acabado de fazer e dissolvido no leite, coisa que quando havia lá em casa eu adorava beber. Mas nunca perguntei se eu tinha ou não razão. Esperava que Lara me dissesse, os olhos de Lara que viam tudo, haviam de ver isso por mim. De qualquer maneira, eu estava de castigo e também não podia falar. Chegaram as festas do santo devoto da freguesia vizinha e os branquelas como eu, só que sem olhos azuis, foram embora sete dias que contei-os eu, embora a Lara dissesse que tinham ido uma semana, que tinha-lhe dito a mãe dela. A mim e à Lara deixaram-nos comida para comer dia não/sim, o que dava-nos para comer três em sete dias, o que se podia considerar um luxo em certas épocas que, segundo os olhos de Lara, aconteciam na exacta altura em que o meu pai adoptivo chegava mais vezes aceso a casa. E lá ficamos nós, trancados em casa e sem poder sair porque os vizinhos não podiam imaginar que nos tinham deixado sozinhos, nós que éramos menores, coisa que era fácil de perceber mesmo para um rapazito de olhos azuis como eu. Pelo menos essa coisa de sermos menores, pelo menos eu, que dava pelo queixo da Lara. O queixo da Lara, as mão da Lara, as pernas da Lara, os seios da Lara… sim, foi nesses sete dias que eu vi Lara nua e percebi o que era uma mulher. Creio que nesse dia os meus olhos ficaram um pouco mais escuros porque nunca me esqueci do corpo chocolate da Lara. Tinha quinze anos menos dois dias, mais os seis meses aproximados que ninguém sabia ao certo se eu tinha. Tinha portanto uma idade aproximada de quinze anos e meio. Era uma equação, termo matemático que aprendi numa aula, difícil de fazer mas que eu já fazia com à-vontade de tantas vezes me perguntarem a idade, e em que eu, sempre a evitar mostrar a minha ignorância, respondia em valores aproximados o que fazia rir as pessoas. A Lara disse-me, com a sabedoria dos seus olhinhos inteligentes de tão negros, para eu não ligar e eu nunca mais liguei. Fazia tudo o que ela me dizia só para me sentir um filho da mãe como ela. Nos três anos seguintes o que fiz, tudo o que fiz foi apaixonar-me pela Lara. A minha Lara do sorriso de luz, tão branco no meio daquele corpo doce de chocolate. Uma noite eu dei a mão a Lara metido a heroi de outrora, e pela porta dos fundos da cozinha, com os olhinhos abertos a iluminar mais do que o luar a noite, corremos os dois em silêncio para não despertar os branquelas ressonadores e deitamo-nos os dois outra vez no celeiro. Eu de olhos fechados para não acordar Lara, e Lara a ver tudo, as estrelas e a lua e a dizer-me como aquilo era tão bonito com aquele cheiro seco a feno e o odor quente da terra de verão. Tinha a idade aproximada de dezoito anos e meio e tudo começou a fazer sentido, isso de eu ser o amor da vida dela e ela ser o amor da minha. Tudo isso fez sentido quando misturamos os nossos corpos como quando o café se misturava no leite na refeição da manhã. A minha Lara de pelúcia. Como da vez que fugimos quando o meu pai adoptivo se acendeu demasiado, fomos encontrados. Não como viemos ao mundo, não, que eu vim ao mundo envolto num manto de lã ao xadrez castanho com tiras cor de mel e uma muito fina de um vermelho velho e pálido. Meteram-nos fora de casa porque éramos dois irmãos incestuosos. A princípio ficamos apreensivos, mas depois a Lara, com os seus olhinhos negros de inteligência, rasgou um sorriso ainda mais filho da mãe do que os outros e disse-me num falso desconsolo: Agora que nos consideram parte da família é que nos põem de cá para fora. Eu pensei que a Lara era mesmo filha da mãe, e tudo o que eu sempre quis foi ser isso mesmo.
quarta-feira, junho 04, 2003
Matrix De-Loaded
O cinema sempre foi um veículo portador de emoções. O que me parece que leva tantas pessoas preferirem o primeiro filme da série ao segundo é a descarga emocional que lhe sucedeu. Nem mesmo o factor romance Neo/Trinity alimenta as emoções, as personagens tornaram-se frias e desligadas do espectador. O filme perdeu a empatia, ao perdermos a empatia com as personagens principais. Neo era fascinante no modo como progredia na aprendizagem dentro da Matrix; o modo como caiu desamparado num mundo totalmente novo, a estranheza que sentia, era a nossa própria estranheza a tentar perceber a história; vimos um ser evoluir, conquistar aos poucos o mundo que o rodeia, e com isso conquistar-nos também. No segundo filme, pegou-se na história mas perdeu-se a emoção. Neo é agora o escolhido, o héroi que luta contra centenas de Smith, sem mácula, como um automato. Onde está o Neo que se aleijava, e que nós sofriamos com ele, Neo é agora uma máquina guerreira. Tão próximo está ele dos inimigos contra os quais luta, que a dada altura tanto me dá que ele morra, que a Trinity morra. Tecnicamente nada a apontar, ao nível da história ele progride numa sequência coerente do Sonho à Esperança, as lutas são de excelente coreografia, mas aonde estão realmente os humanos, e quem são as máquinas? Não me parece que o problema esteja num Keanu Reaves inexpressivo, ele também já o era no primeiro. O grande senão do filme é o erro do título, o Matrix não foi carregado, mas sim descarregado de emoções. Não é uma cena de amor que faz um romance pois não?
O cinema sempre foi um veículo portador de emoções. O que me parece que leva tantas pessoas preferirem o primeiro filme da série ao segundo é a descarga emocional que lhe sucedeu. Nem mesmo o factor romance Neo/Trinity alimenta as emoções, as personagens tornaram-se frias e desligadas do espectador. O filme perdeu a empatia, ao perdermos a empatia com as personagens principais. Neo era fascinante no modo como progredia na aprendizagem dentro da Matrix; o modo como caiu desamparado num mundo totalmente novo, a estranheza que sentia, era a nossa própria estranheza a tentar perceber a história; vimos um ser evoluir, conquistar aos poucos o mundo que o rodeia, e com isso conquistar-nos também. No segundo filme, pegou-se na história mas perdeu-se a emoção. Neo é agora o escolhido, o héroi que luta contra centenas de Smith, sem mácula, como um automato. Onde está o Neo que se aleijava, e que nós sofriamos com ele, Neo é agora uma máquina guerreira. Tão próximo está ele dos inimigos contra os quais luta, que a dada altura tanto me dá que ele morra, que a Trinity morra. Tecnicamente nada a apontar, ao nível da história ele progride numa sequência coerente do Sonho à Esperança, as lutas são de excelente coreografia, mas aonde estão realmente os humanos, e quem são as máquinas? Não me parece que o problema esteja num Keanu Reaves inexpressivo, ele também já o era no primeiro. O grande senão do filme é o erro do título, o Matrix não foi carregado, mas sim descarregado de emoções. Não é uma cena de amor que faz um romance pois não?
Fidelidade
Na Vodafone, para utilizar os pontos adquiridos com as chamadas feitos, pedem-me fidelidade por mais 18 meses. na Optimus pedem-me o mesmo. Encho o depósito numa bomba da Galp e logo me tentam com uma promoção, onde tenho de coleccionar pontos para conseguir prémios. Sou convidado à fidelidade. Na Esso e na BP fazem-me o mesmo. A Coca-cola dá-me pontos por cada lata de refrigerante que consumo. Tentam-me, vou ser fiel. Mas a Pepsi faz-me o mesmo. Fico dividido. Não gosto da fidelidade imposta. Anoto: antes de chegar a casa trair a namorada, confessar, e então sim, conseguir uns pontos.... na cara. O mundo está cada vez mais feminino.
Na Vodafone, para utilizar os pontos adquiridos com as chamadas feitos, pedem-me fidelidade por mais 18 meses. na Optimus pedem-me o mesmo. Encho o depósito numa bomba da Galp e logo me tentam com uma promoção, onde tenho de coleccionar pontos para conseguir prémios. Sou convidado à fidelidade. Na Esso e na BP fazem-me o mesmo. A Coca-cola dá-me pontos por cada lata de refrigerante que consumo. Tentam-me, vou ser fiel. Mas a Pepsi faz-me o mesmo. Fico dividido. Não gosto da fidelidade imposta. Anoto: antes de chegar a casa trair a namorada, confessar, e então sim, conseguir uns pontos.... na cara. O mundo está cada vez mais feminino.
Keanu
Considerações estéticas profundas à parte, valha-nos a fabulosa nuca do senhor!
Não sendo de uma beleza extraordinária, o ar exótico vale mais.
Trata-se de um imprescindível requesito ( para mim ): uma nuca bem desenhada, longa e bonita.
Já quanto ao talento, deixo as considerações a quem de direito.
Considerações estéticas profundas à parte, valha-nos a fabulosa nuca do senhor!
Não sendo de uma beleza extraordinária, o ar exótico vale mais.
Trata-se de um imprescindível requesito ( para mim ): uma nuca bem desenhada, longa e bonita.
Já quanto ao talento, deixo as considerações a quem de direito.
terça-feira, junho 03, 2003
segunda-feira, junho 02, 2003
domingo, junho 01, 2003
Perfeitos Anormais
Estava a ver pela primeira o programa dos perfeitos anormais Nuno Markl e Luis Alvim na Sic Radical, quando a determinada altura o Mário Mata - aquele do "Não há nada para ninguém" - nos conta uma história dos idos anos 80, quando ele e o Jorge Palma cantavam na rua em plena Lagos e são abordados pela polícia que os quer prender porque atrapalharem o tráfego de peões na via pública, "Felizmente" - assim conta Mário Mata - "havia por lá também um grupo de pacifistas meus amigos" e aquilo desata tudo à pancada. E eu que pensava que este tipo de pacifismo era uma consequência da tão proclamada globalização. Vou ter de mudar a minha noção da história, aliás, temos mesmo muito pouca perspectiva Histórica. Sempre que vejo um grupo de pacifistas fico com medo, ao menos com os rúfias à séria uma pessoa sabe com o que conta. Ou como diria o Ségio Godinho: "Pode alguém ser quem não é?".
Estava a ver pela primeira o programa dos perfeitos anormais Nuno Markl e Luis Alvim na Sic Radical, quando a determinada altura o Mário Mata - aquele do "Não há nada para ninguém" - nos conta uma história dos idos anos 80, quando ele e o Jorge Palma cantavam na rua em plena Lagos e são abordados pela polícia que os quer prender porque atrapalharem o tráfego de peões na via pública, "Felizmente" - assim conta Mário Mata - "havia por lá também um grupo de pacifistas meus amigos" e aquilo desata tudo à pancada. E eu que pensava que este tipo de pacifismo era uma consequência da tão proclamada globalização. Vou ter de mudar a minha noção da história, aliás, temos mesmo muito pouca perspectiva Histórica. Sempre que vejo um grupo de pacifistas fico com medo, ao menos com os rúfias à séria uma pessoa sabe com o que conta. Ou como diria o Ségio Godinho: "Pode alguém ser quem não é?".
Neste blog não se apagam posts; não se alteram frases; não se reescrevem textos; e se, por vezes, corrigimos um ou outro erro gramatical é porque a língua portuguesa nos merece todo o respeito. E se há alturas em que a Espada serve para esgrimir conceitos, ideias ou meras percepções do que nos rodeia contra antagonistas, tentamos sempre lembrar-nos de que ela - a Espada - é o objecto que a Justiça - a imagem simbólica - tem numa das mãos para executar a sentença depois de analisada nos dois pratos da balança que segura na outra das mãos.
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