quinta-feira, junho 12, 2003

O Azul do Teu Mar

O pessoal do Mar Salgado parece que aproveitou o fim de semana para ir à Zambujeira do Mar. Fizeram-me saudades. Descer à Praia dos Alteirinhos, regressar da praia e ir ao bar do Ti Manel comer uns camarões e beber umas cervejas, jantar um peixinho no restaurante da Rita, beber umas caipinhas no Bar do Carlos e acabar a noite no Clube da Praia é uma rotina extremamente familiar e da qual tenho uma certa saudade. Fica aqui uma história em que a semelhança com acontecimentos reais não será uma total coincidência...

O azul do teu mar
Entrou no bar eram umas duas da manhã. Distribuia sorrisos a todos, ignorando o ciume miudinho que me corroia por dentro. Vestia de vermelho como na primeira vez que a vi, faz este mês de Agosto um ano. Outra vez o mesmo destino de férias. Mas sabe bem reencontrar caras conhecidas e tudo na mesma, faz-me sentir em casa. É isso que me faz voltar cá. Deixo os meus amigos e dirijo-me ao bar aonde ela foi buscar uma bebida. Temos o mesmo hábito de bebida, mas hoje em dia toda a gente bebe a mesma coisa, e não é isso que nos identifica. Continuo a procura de coisas comuns entre nós sem saber muito bem para quê, nem a quê que isso me leva. Fico só suficientemente perto dela para poder ouvir a sua voz. Tenho esta mania das vozes, das mãos e dos sapatos, de observar as pessoas e construir teorias sobre quem são com estes dados. O teste final é o toque. Pode destruir tudo. Todas as terorias e todas as emoções que pernoitam na alma. Oiço-a descrever a tarde de praia que teve, as brincadeiras que fizeram, as piadas que contaram, os banhos que contaram. Gosto destas raparigas com este poder descricionário, como uma pintura hiper-realista onde o detalhe sobressai da paisagem em pinceladas naturais. Eu sou um impressionista, só um quadro complexo de ideias que dificilmente vou conseguir relatar. Já quase não me lembro da minha tarde de praia. Ficaram pinceladas de coisas como fantasmas que passeiam dentro de um quadro azul. Gosto deste bar ao ar livre, com uma cobertura de palha, com a sua musica própria de ritmos latinos que contrasta com a musica house que percorre os ouvidos das pessoas que dançam dentro da zona coberta. Eu fico de longe a observa-los, enquanto continuo a ouvi-la contar histórias. Vivemos na era da informação, penso eu como desculpa da minha atitude invasiva. Não resisto muito tempo à minha consciência e volto para junto dos meus amigos. Faço um esforço minimo para que os meus olhos se cruzem com os dela mas o momento não nos pertence. Chamo-me de covarde três vezes e nem sequer discuto comigo mesmo. Normalmente digo que sou tímido mas eu sei que no fundo sou mesmo covarde. O medo de rejeição faz parte da minha constituição sanguínea. O que eu precisava era de uma transfusão da alegria dela e não deste sentido ilusório que o alcool da mistura feita no copo provoca. Vagueio durante umas horas entre os meus amigos, pessoas que vou conhecendo, o bar e um sentido posicional estratégico que dá sempre para os seus olhos azuis, estrelas cintilantes no céu escuro da noite. Estrelas que me guiam, fárois que marcam a posição perigosa das escarpas onde certamente naufragava. Há um sentido metafisico no mundo, o qual se pode provar a sua existência; gosto de fixar o meu olhar nela mesmo quando ela está de costas para mim. Fico ali, até ela se virar de incomodada e olhar directamente para os meus olhos, como se soubesse que eu a olhava. E sabia, com um saber que ultrapassa a noção Física. Eu acovardava-me ainda mais, baixava os olhos e perdia a força de lutar. O bar funcionava outra vez como ponto de fuga de uma perspectiva que principiava a desfocar-se.

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