sábado, junho 14, 2003

A pergunta

Tenho buracos de mágoas no meu coração mais parecendo uma esponja. Mas tu sabes disso. Perguntaste um dia destes quando te escreveria alguma coisa que fosse para ti. Eu sorri. Não tinha a mínima vontade de te responder. Mas também sobre isso tu sabes. E ainda, que me perguntaste logo depois o que precisarias fazer para que isso acontecesse. Sim, isso de eu escrever alguma coisa que fosse para ti e te fizesse uma qualquer cócega na alma. O que terias de fazer de tão psicologicamente intenso? Foram as tuas palavras, que usaste como um torniquete à minha paz. Sei que foi um longo silêncio o meu, e que demorou meses e quase te fez chorar de mimo. Se ainda quiseres saber, eu digo: Nada. É isso mesmo, mesmo que pareça estúpido. Não faças nada, deixa-me ser eu a fazê-lo.

Acordei nesse mesmo dia ainda antes de adormecer seriamente, envolto nos restos da embriaguez dos teus beijos, naquele turbilhão sempre louco da libido e do álcool. Como poderás ler. Foi tão bom que ainda agora me recordo do paladar perfurmado da saliva, e como nos sentimos siameses com o carinho ainda colado nas nossas bocas, agarrado a elas como uma lapa teimosa que resiste na sua rocha contra a violência das ondas. Faltou paixão, dirás tu. Pelo menos daquela bruta, que faz doer. Como tu gostas e eu gosto, daquelas paixões que apertam a alma como uma asfixia só colmatada numa qualquer metáfora de uma respiração boca-a-boca. Mas, tu sabes tão bem, se fosse dessa paixão que nós sofrêssemos, eu escrevia-te livros. Os que pudesse. Por isso eu te digo: não faças nada, mantém-te quieta. Ou então, deixa que essa paixão tola e imprevisível surja como os tornados que tudo varrem e surgem do nada. Que surja de mim para ti. Mas não te apaixones por mim. Não. Porque, a verdade é esta, em estados de felicidade não escrevo. Não escrevo e ponto final. A paixão abraça-me de tal forma que se torna impossível mover-me noutro sentido que não seja saciar essa vontade da volúpia. Embora aquela sinfonia suave dos teus beijos faça crer que tudo isso um dia seja possível.

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