terça-feira, maio 06, 2003

A deixa
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Eram dez em ponto quando acertámos os relógios. Só pensava em nunca mais vir trabalhar de ressaca. O João ia à frente a conduzir. Tinha boa pinta dizia a minha namorada. Às vezes penso que ela queria meter-se debaixo dele. Ou em cima que é como ela mais gosta, mas isso são pormenores. Ao lado vai o outro João, que nós chamamos Dj porque uma vez comprou trinta cd's sem os discos, só tinham a mesmo a capa de plástico. De resto, Dj, servia para os diferenciar. Ao meu lado o Gabriel, ou o puto, como nós o chamávamos, apesar de ser sempre o mais sereno e imperturbável de todos nós. Eu por mim ouvia um bocado de música para descontrair mas o João não gosta de ouvir música quando vai trabalhar, e depois, ele é que manda. E como temo sempre que eles não gostem muito de mim, fico calado. De qualquer maneira, sei que sou bom naquilo que faço e que precisam de mim. Isso já me dá algum consolo. O João conduz devagar. É sempre assim quando vai trabalhar, nunca comete nenhuma infracção, o que eu só acho que ainda dá mais nas vistas. Mas ele é que sabe, e é ele que manda. Paramos a cerca de cem metros do trabalho, e o João diz que hoje o puto fica no carro. O João manda e distribui as ordens. Diz para eu seguir à frente e cumprir o combinado, ou seja, o João dá a deixa. Eu entro primeiro no trabalho enquanto eles esperam um pouco para entrarem depois. Eu estou na fila no caixa três. Ouço o barulho de gente a entrar e parecem-me ser eles. A deixa deve estar a aparecer. Lá de trás alguém, grita mãos ao alto! É a minha deixa, saio da fila, puxo do revólver e aponto-o ao caixa que não se mostra muito aflito. Logo a seguir, sinto o cano frio de um revólver no meu pescoço, sensação que já tive oportunidade de experimentar. Rodo devagarinho o corpo, com a arma suspensa no dedo indicador inofensiva. Vejo cinco polícias armados e protegidos até aos dentes e por detrás do grande vidro da fachada do banco, o João, o Dj, e o puto a rirem feitos três anormais.

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