quinta-feira, maio 15, 2003

Aromas

Não podia deixar de dar um contributo para tão particular tema (quem me conhece sabe bem que é assim), mas as considerações olfactivas que deambulam pela blogoesfera parece que esquecem um ponto crucial, cada um é que escolhe como anda, independentemente do que quer transmitir.
Não creio ser condição exclusivista o ter ou não ter um determinado cheiro e/ou aparência, tudo depende da impressão que se quer dar. Já encontrei pessoas bem arranjadas que pareciam pairar numa nuvém de esgoto, como se encontram pessoas que com o pouco que têm, se apresentam impecáveis. É uma questão de educação e civismo antes de tudo.
Mas devo ressalvar que muitas das pessoas que primam pela revolta e se insurgem contra o establishment, no fundo escudam-se nos mais básicos e primários instintos anti-sociais, o de afastar presumíveis concorrentes da esfera física. A falta crónica de um banho não é só uma questão de cultura, é também de saúde pública - basta estarem num qualquer espaço aglomerado com alguém que emana odores putrefactos e verão a reacção da generalidade das pessoas: a repulsa.
A nossa recente cultura de culpabilização social tem-nos impedido de evoluir a este nível. Alguém que se atreva a discurrer sobre este assunto e já está a levar com o épipeto de "fascista-que-abomina-as-classes-sociais-mais-baixas" ou de "frívolo-fútil-inconsequente". Nada mais falso, a qualidade da aparência não depende tanto do dinheiro que temos, mas antes da cultura que temos para jogar com ela.
Uma das minhas recordações de infância mais queridas é a dos domingos de missa, numa aldeia de pescadores em Espanha, não havia quem fosse mal arranjado e mal cheiroso à missa (mesmos os punks e rockabillies se apresentavam sem resquícios de odores provocatórios de fuga).
Claro que temos o antípoda mesmo aqui ao lado, trata-se de quem, pela mesma falta crucial de educação gasta uma frasco de 100ml de essência de uma só vez. O resultado é assaz atroz! A repulsa é a mesma que tem o mal-amanhado, não é a qualidade olfactiva que faz tanto a diferença, é sim a quantidade que se emana. A ponderação é uma virtude.
Quanto à aparência, como vaidosa convicta, creio que o aspecto visual tem influência na forma que nos relacionamos com os demais, claro que abomino a superficialidade - a não ser como objecto de apreciação estética -, mas quem de consciência tranquila pode dizer que, quando olha para alguém a primeira impressão que tem não é visual (costumo dizer que quando se vê alguém pela primeira vez e nos desperta o interesse, não nos pomos a dissertar sobre as suas virtudes e qualidades como pessoa).
Já quanto à cultura, penso tratar-se também de um problema eminentemente educacional, pode-se ser culto e bonito - quando se está no cabeleireiro/estéticista/ginásio, o que é que nos impede de ler? Apenas a perguiça induzida desde a mais tenra infância.
Não penso de todo que o aspecto andrajoso contribua de qualquer forma para a elevação dos conhecimentos adquiridos, no entanto penso que o aspecto e o aprumo podem e devem coabitar com estes.
A particularidade nacional no caso, tem muito a ver com a nostalgia socialista que impera no sector jornalístico e intelectual.

PS: o ser vaidosa não implica, obrigatoriamente, que tenha uma grande consideração estética da minha pessoa.

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