domingo, setembro 07, 2003

O tempo dos sonhos

Acordo no teu rosto, os teus olhos na minha boca. Soluçar umas palavras pela manhã, a voz presa do cansaço, do teu corpo. O teu olhar sereno e o contraste da tua maquilhagem esborarratada, o negro a sair do verde dos teus olhos. Abro a portada para deixar entrar a manhã, a janela para recuperar o ar queimado no ardor do sexo. São as últimas horas que passas aqui. Não o sabemos, mas no ar o silêncio já o pronuncia. Volto a deitar-me contigo, os corpos ainda quentes, ainda muito quente a desafiarem o frio da manhã que irrompe da janela aberta. A vida acorda a nossa volta, nós ainda mortos, do cansaço do amor, da noite por dormir, de nos perdermos na imagem de uma lua redonda. Conto-te histórias nos teus cabelos, histórias vividas tempos antes, histórias inventadas de um futuro que tudo fará para não se cumprir. O futuro contra mim, contra nós. É essa a luta, tu também sabes. Que o tempo se saboreia no tempo, no tempo todo em que os sonhos ainda são possíveis. Não muito depois, tu já cá não estás.

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